quinta-feira, 8 de novembro de 2012

ATIVIDADES SOBRE A OBRA "OTELO"

ATIVIDADE SOBRE OTELO


Após ler o resumo e análise da obra Otelo, responda as questões:

1- Qual é a grande mensagem que Otelo deixa para nós?
2- O mal prevalece na obra? Por quê?
3- Qual era o verdadeiro caos que Otelo, com razão, tanto temia, caso deixasse de amar Desdêmona?
4- Como acontece o final da obra?
5- Otelo deseja e precisa ser o protagonista de um romance shakespereano, mas torna-se o herói vitimado da mais sofrida das tragédias de Shakespeare. Explique.
6- Por que Iago consegue envenenar e enganar Otelo?
7- Iago aparentava ser uma pessoa boa e digna de confiança, mas ele mostrou ser justamente o oposto, ou seja, maligno e traidor, pois o fascínio pelo poder, que vêm a ser o mesmo que o fascínio pelo mal, é inato ao ser humano. Justifique a afirmativa.
8- Quais os pontos que há em comum entre a obra Otelo e Dom Casmurro?
9-  Na tragédia são encontradas várias idéias que retratam o preconceito racial e religioso. Exemplifique.
10- Cite alguma parte da obra Dom Casmurro em que Machado de Assis cita ou se refere à obra Otelo.

Bom exercício!

Beijocas Coloridas!

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

RESUMO E ANÁLISE DA OBRA - OTELO - WILLIAM SHAKESPEARE

Otelo
(William Shakespeare)

A linguagem de Shakespeare, rica e criadora, contém todos os elementos anglo-saxônicos e latinos da língua inglesa, que o poeta enriqueceu com um maior número de citações, locuções e frases proverbiais do que qualquer outro autor, respeitando a versão original, mas fez algumas modificações: Shakespeare busca a comédia e o romance naturalmente, mas chega à tragédia por meio da violência e da ambivalência; atribuiu ao Mouro um caráter mais nobre e refinado, e também uma função de destaque em Veneza; aumentou a importância de Emília na trama; acentuou a malignidade de Iago; criou novos personagens e eliminou outros.

Obviamente, Shakespeare não é Lord Byron, que exibe por toda a Europa o coração sangrando; contudo, a imensa agonia que sentimos ao ver Otelo matar Desdêmona é informada não apenas por uma intensidade exterior, mas, também, interior e é justamente este fato que faz de Otelo uma tragédia do ciúme, peça de construção perfeita, onde a psicologia do Mouro ciumento e a da maldade diabólica de Iago, bem como a lógica dos acontecimentos - tradução de uma fatalidade inexorável - conduzem o espectador ao clima dos grandes modelos de tragédias gregas citadas por Aristóteles.

Bem encenada, Otelo será um trauma para a platéia, ainda que momentâneo; e desta forma o foi para Harold Bloom que afirma que a obra o apavora ainda mais do que outras peças shakesperianas, pois se trata de uma dor imponderável, desde que se conceda a Otelo a imensa dignidade e o valor que tornam a degradação do personagem algo tão terrível.
"Ó cão espartano, mais feroz do que a angústia, a fome ou o mar! Olha o fardo trágico desta cama! É trabalho teu (...)! Quanto a vós, governador incumbe o castigo deste trabalho infernal. Determinai a hora, o lugar, a tortura... É preciso que seja terrível! Quanto a mim, embarco de imediato e vou ao Senado relatar, com o coração acabrunhado esta dolorosa ocorrência!".
Shakespeare neste aspecto é um pouco mais otimista, mas Iago não conseguirá escapar do destino certo e justo.

Quanto às versões para o cinema, uma das melhores adaptações é a do diretor Oliver Parker que foi também roteirista do filme Otelo de 1995. Segue fielmente nos diálogos a poesia dramática shakespereana e coloca pela primeira vez um Otelo negro. Em outras versões, tanto para teatro como para cinema em que Orson Welles interpreta o mouro, tendo escurecido o rosto para tal, nunca se havia utilizado de uma pessoa negra, o que vem a rechaçar uma das causas de confronto da peça, que é o preconceito racial; e com grande mérito o autor Laurence Fishburne encarna perfeitamente a divindade de Otelo. Kenneth Brannagh, grande discípulo de Shakespeare da atualidade, está perfeito na interpretação do vilão Iago piscando maliciosamente para o público e mostrando todo o cinismo do personagem e dizendo:
"Quero que o Mouro me agrade, goste de mim e recompense-me por haver feito dele um astro insigne e perturbado sua paz e quietude até que ele fique louco!".
É uma versão interpretada e filmada sábia e brilhantemente. Nas próximas páginas, vamos adentrar numa análise mais literária da obra.

·         Resumo da Obra

A tragédia Otelo foi publicada pela primeira vez por volta de 1622. No entanto, sua composição é datada de 1604. Seu personagem principal, que empresta o nome à obra, é um general mouro que serve o reino de Veneza.
Toda a história gira em torno da traição e da inveja. Inicia-se com Iago, alferes de Otelo, tramando com Rodrigo uma forma de contar a Brabâncio, rico senador de Veneza, que sua filha, a gentil Desdêmona, tinha se casado com Otelo. Iago queria vingar-se do general Otelo porque ele promoveu Cássio, jovem soldado florentino e grande intermediário nas relações entre Otelo e Desdêmona, ao posto de tenente. Esse ato deixou Iago muito ofendido, uma vez que acreditava que as promoções deveriam ser obtidas "pelos velhos meios em que herdava sempre o segundo posto o primeiro" e não por amizades.
Brabâncio, que deixara a filha livre para escolher o marido que mais a agradasse, acreditava que ela escolheria, para seu cônjuge, um homem da classe senatorial ou de semelhante. Ao tomar ciência que sua filha havia fugido para se casar com o Mouro, foi à procura de Otelo para matá-lo. No momento em que se encontraram, chega um comunicado do Doge de Veneza, convocando-os para uma reunião de caráter urgente no senado.
Durante a reunião, Brabâncio, sem provas, acusou o Mouro de ter induzido Desdêmona a casar-se por meio de bruxarias. Otelo, que era general do reino de Veneza e gozava da estima e da confiança do Estado por ser leal, muito corajoso e ter atitudes nobres, fez, em sua defesa, um simples relato da sua história de amor que foi confirmado pela própria Desdêmona. Por isso, e por ser o único capaz de conduzir um exército no contra-ataque a uma esquadra turca que se dirigia à ilha de Chipre, Otelo foi inocentado e o casal seguiu para Chipre, em barcos separados, na manhã seguinte. Durante a viagem uma tempestade separou as embarcações e, devido a isso, Desdêmona chegou primeiro à ilha. Algum tempo depois, Otelo desembarca com a novidade que a guerra tinha acabado porque a esquadra turca fora destruída pela fúria das águas. No entanto, o que o Mouro não sabia é que na ilha ele enfrentaria um inimigo mais fatal que os turcos.
Em Chipre, Iago com raiva de Otelo e Cássio, começou a semear as sementes do mal, ou seja, concebeu um terrível plano de vingança que tinha como objetivo arruinar seus inimigos. Hábil e profundo conhecedor da natureza humana, Iago sabia que de todos os tormentos que afligem a alma, o ciúme é o mais intolerável. Ele sabia que Cássio, entre os amigos de Otelo, era o que mais possuía a sua confiança. Sabia também que a sua beleza e eloqüência eram qualidades que agradam as mulheres, ele era o tipo de homem capaz de despertar o ciúme de um homem de cor, como era Otelo, casado com uma jovem e bela mulher branca. Por isso, começou a realizar o seu plano.
Sob pretexto de lealdade e estima ao general, Iago induziu Cássio, responsável por manter a ordem e a paz, a se embriagar e envolver-se em uma briga com Rodrigo, durante uma festa em que os habitantes da ilha ofereceram a Otelo, que estava na companhia de sua amada. Quando o Mouro soube do acontecido, destituiu Cássio do seu posto.
Nessa mesma noite, Iago começou a jogar Cássio contra Otelo. Ele falava, dissimulando um certo repúdio a atitude do general, que a sua decisão tinha sido muito dura e que Cássio deveria pedir à Desdêmona que convencesse Otelo a devolver-lhe o posto de tenente. Cássio, abalado emocionalmente, não se deu conta do plano traçado por Iago e aceitou a sugestão.
Dando continuidade ao seu plano, Iago insinuou a Otelo que Cássio e sua esposa poderiam estar tendo um caso. Esse plano foi tão bem traçado que Otelo começou a desconfiar de Desdêmona.
Iago sabia que o Mouro havia presenteado sua mulher com um lenço de linho, o qual tinha herdado de sua mãe. Otelo acreditava que o lenço era encantado e, enquanto Desdêmona o possuísse, a felicidade do casal estaria garantida. Sabendo disso e após conseguir o lenço através de sua esposa Emília que o havia encontrado, Iago disse a Otelo que sua mulher havia presenteado o amante com ele. Otelo, antes tão equilibrado, já estava enciumado, e pergunta à esposa sobre o lenço e ela, ignorando que o lenço estava com Iago, não soube explicar o que havia acontecido que ele havia sumido. Nesse meio tempo, Iago colocou o lenço dentro do quarto de Cássio para que ele o encontrasse.
Depois, Iago fez com que Otelo se escondesse e ouvisse uma conversa sua com Cássio. Eles falaram sobre Bianca, amante de Cássio, mas como Otelo só ouviu partes da conversa, ficou com a impressão de que eles estavam falando a respeito de Desdêmona. Um pouco depois, Bianca chegou trazendo enciumada um lenço que estava no quarto de Cássio e discutiram sobre a origem do mesmo.
Vale ressaltar que o lenço era, como todo lenço feminino, fino e delicado, isso significa que quando Otelo o deu para Desdêmona, ele não a presenteou com um simples lenço, na verdade o que ele deu à ela foi tudo o que há de mais fino e delicado existente em sua pessoa. Otelo ficou fora de si ao imaginar que Desdêmona havia desprezado tudo isso dando o lenço a um outro homem.
As conseqüências disto foram terríveis: primeiro Iago, jurando lealdade ao seu general disse que para vingá-lo mataria Cássio, mas sua real intenção era matar Rodrigo e Cássio simultaneamente porque eles poderiam estragar seus planos. No entanto, isso não ocorreu conforme suas intenções, Rodrigo morreu e Cássio apenas ficou ferido. Depois Otelo, totalmente descontrolado, foi a procura de sua esposa acreditando que ela o havia traído e matou-a em seu quarto. Shakespeare faz da cena um sacrifício religioso, dotado de conteúdo contrateológico tão sombrio quanto o niilismo de Iago e o ciúme “divino” de Otelo.
Após isso Emília, esposa de Iago, sabendo que sua senhora fora assassinada revelou a Otelo, Ludovico (parente de Brabâncio) e Montano (governador de Chipre antes de Otelo) que tudo isso foi tramado por seu marido e que Desdêmona jamais fora infiel. Iago matou Emília e fugiu, mas logo foi capturado. Otelo, desesperado por saber que matara sua amada esposa injustamente, apunhalou-se, caindo sobre o corpo de sua mulher e morreu beijando a quem tanto amara.
Ao finalizar a tragédia Cássio passou a ocupar o lugar de Otelo e Iago foi entregue as autoridades para ser julgado.

1-  Análise Dos Personagens

Otelo - General mouro e nobre a serviço da República de Veneza. Segundo Harold Bloom, dentro de suas óbvias limitações, Otelo, de fato é "nobre": seu consciente antes da queda, está sob firme controle, sendo justo e absolutamente digno, dotado de perfeição inata; quando Otelo, sem dúvida, a espada mais ágil do lugar, quer separar uma briga de rua basta um comando: "Embainhai vossas armas reluzentes, para que não embacieis o orvalho...". Ainda é a representação mais tocante da vaidade e do temor masculinos com relação à sexualidade feminina e, por conseguinte, da equação masculina entre os medos da traição e da morte. O Mouro é impotente diante de Iago; tal impotência é o elemento mais angustiante da peça, à exceção, talvez da dupla fragilidade de Desdêmona, com relação ao marido e a Iago. E para Iago, ele representava tudo, porque a guerra era tudo; sem Otelo, Iago é nada, e ao guerrear contra Otelo, Iago luta contra a ontologia. Interessante notar que Shakespeare conferiu a Otelo capacidade de expressão curiosamente heterogênea, a um só tempo, singular e desarticulada, e, propositadamente, falha. O Mouro afirma ter sido guerreiro desde os sete anos de idade; mesmo supondo que a afirmação seja hiperbólica, temos de convir que Otelo tem plena consciência de que sua grandeza foi conquistada à custa de muito suor. Contudo, apesar de toda a fama, Otelo denota certa insegurança, ás vezes, manifesta em seu discurso rebuscado e barroco, satirizado por Iago como "frases empoladas de termos de militança". A dor memorável, ou a memória induzida pela dor, emana de uma ambivalência, ao mesmo tempo cognitiva e afetiva, podemos observar isto, quando, conscientemente Otelo ao se casar com Desdêmona, põe em risco a auto-imagem construída a duras penas, e tem premonições corretas do caos se o amor fracassar:
"Pobre querida! Quero ser maldito se não te amo! E no dia em que eu deixar de te amar, que o universo se converta de novo em caos!".

Desdêmona - cujo próprio nome em grego significa "desventurada", prenunciando o destino que a aguarda. É uma jovem nobre, pretendida por vários jovens das melhores famílias da República, não apenas por sua beleza, mas também por seu rico dote. Ela era "uma jovem tão tímida, de espírito tão sossegado e calmo, que corava de seus próprios anseios!". Tais características ficam explícitas na atitude de seu pai, que ao saber que ela se casou com o Mouro, atribuiu tal fato à bruxaria. Otelo fala claramente como se deu o amor entre ambos: "ela me amou pelos perigos que corri, e eu a amei pela pena que ela teve!". Desdêmona, de bom grado, deixa-se seduzir pelo romance ingênuo e arrebatador da autobiografia de Otelo que provoca nela "um mundo de suspiros". O Mouro não é apenas nobre; a saga de sua vida faz "uma menina que sempre foi meiga" (segundo Brabâncio, seu pai) "deixar-se apaixonar por alguém que, antes disso, ela não fitaria sem horror!". Desdêmona, figura do Alto Romantismo, séculos à frente de seu tempo, cede ao fascínio da conquista, se é que se pode usar o verbo "ceder" para descrever entrega tão voluntária e direta. Todo esse perfil singelo que envolve Desdêmona sofre uma brusca alteração quando ela abandona a sua família e, apesar das diferenças, vai viver ao lado de Otelo em sua vida aventurosa de militar. O fim de Desdêmona é extremamente triste: além de ter sua imagem de esposa dedicada maculada, ela é abandonada por Deus, ou seja, nos seus últimos momentos de vida, não teve sequer o consolo da religião; Shakespeare, desta forma promove imenso "pathos" ao só revelar Desdêmona em toda a sua natureza e esplendor quando temos certeza de que está condenada e como uma ópera, Shakespeare permite a ela apenas na hora da morte, desobrigar Otelo, o que seria algo incrível, não fosse ela, segundo a tocante de Alvin Kernan, "a palavra shakespereana que significa amor". Somos levados a crer que essa terá sido a mais pura das jovens, tão fiel ao próprio assassino que as últimas palavras, exemplares, são quase irônicas, diante da degradação de Otelo: "Dá lembranças minhas ao meu senhor querido... adeus...adeus!". Desdêmona é um personagem que, além de tudo o que já foi dito, nos ajuda a entender um pouco mais do próprio Otelo. Por meio dela nos é revelado os traços morais de Otelo, características essas que contrastam com seu exterior rude.

Iago - o tempo todo, a falsidade e a corrupção permanecem em segredo. A dissimulação pérfida de Iago reina entre a aparência e a realidade. Para Shakespeare, o mal é insondável e infinito e os personagens depravados invadem o palco como haviam invadido a Corte. Shakespeare assume a tragédia moral de sua época. Segundo Germaine Greer, professora de Literatura Inglesa na Universidade de Warwick, existe um elemento na tragédia de Shakespeare que ela chama de psicomaquia que é uma luta dentro da própria alma que pode ser externalizada de várias formas. Uma delas é o mal atuando sobre o protagonista. Shakespeare mostra ainda como um tipo de mal tende a manifestar-se. O personagem é onipresente. Está em todos os lugares enganando a todos ao mesmo tempo. Para Otelo ele era tudo como um honesto soldado e de bom comportamento. A posição de Iago como porta-bandeira, tendo jurado morrer antes de permitir que as cores de Otelo sejam capturadas em batalha, atesta não apenas a confiança de Otelo, mas a fidelidade de Iago no passado. Paradoxalmente, a devoção quase religiosa por Otelo, um deus da guerra, por parte do fiel Iago, pode ser inferida como causadora da preterição. Iago, conforme apontou Harold Goddard, está sempre em guerra; é um piromaníaco moral, que ateia fogo à realidade. Apesar da sensatez que, decerto, caracterizava seu tirocínio militar, Otelo enganou-se com Iago, artista tão livre de si mesmo. A catástrofe primeira da peça é o que seria chamado de "a queda de Iago", que estabelece um paradigma para a queda de Satã em Milton. O Deus de Milton, assim como Otelo, rebaixa o mais devotado dos seus servidores, e o magoado Satã rebela-se. Incapaz de derrubar o Ser Supremo, Satã derrota Adão e Eva; mas o sutil Iago vai mais longe, pois seu único Deus é o próprio Otelo, cuja queda se torna a vingança maior de Iago, arrasado pela rejeição, talvez, como conseqüência da mesma, sofrendo de uma impotência quase que sexual e de um forte sentimento de perda e fracasso, de não ser mais aquilo que fora. Sua grande bravata - "Nunca mostro quem sou!" - contradiz, propositadamente o apóstolo Paulo: "Com a graça de Deus, sou quem sou!", mas Shakespeare deixa o espectador conhecê-lo a fundo. Ele ri às escondidas de suas maldades e tem o público como seu confidente. Acena e pisca o olho para a platéia com seu olhar matreiro, querendo atrair o público com sua esperteza. Só nós os espectadores conhecemos as intenções de suas maquinações e sua importância é tanta que Shakespeare não sentiu necessidade de revisar o personagem de Iago, perfeição do mal e gênio do ódio. Não há dúvida quanto à centralidade de Iago na peça: a ele são atribuídos oito solilóquios, a Otelo apenas três. Que existe, igualmente, uma certa opacidade, não temos como negar; a tragédia de Otelo é, precisamente, o fato de Iago conhecê-lo melhor do que ele próprio se conhece; à sua maneira excepcional, foi o mais inquisidor e universal dos observadores, possivelmente, inclusive no que diz respeito ao esoterismo espiritual, ainda que sempre levado pelos propósitos de descobrir ou inventar. Iago é figura terrível porque possui habilidades fantásticas, talentos dignos de um fiel devotado cuja fé foi transformada em niilismo. Caim, rejeitado por Javé em favor de Abel, é pai de Iago, assim como Iago é o precursor do Satã de Milton. Iago mata Rodrigo e fere Cássio, mas a idéia de Iago esfaquear Otelo é tão inconcebível para o próprio Iago quanto para nós. Quando somos rejeitados por nosso deus, temos de atingi-lo espiritual ou metafisicamente, e não apenas fisicamente.

Cássio - jovem matemático florentino que "nunca comandou nenhum soldado num campo de batalha e que conhece tanto de guerra como uma fiandeira". Mesmo assim, foi escolhido por Otelo para ocupar o posto de tenente. Cássio foi o grande intermediário das relações amorosas entre Desdêmona e Otelo e, por isso, gozava da confiança do casal. Ele era amante de Bianca que vivia em Chipre. Cássio era ingênuo, não percebeu que Iago tramava a sua desgraça, deixou-se embriagar enquanto estava de guarda, envolveu-se em uma briga e, por esse motivo, foi destituído do seu posto. Isso levou-o ao desespero e transformou-o em uma verdadeira marionete nas mãos de Iago. Cássio pode ser considerado como personagem coadjuvante, uma vez que Iago se apóia em sua figura para executar seus planos.

Brabâncio - pai de Desdêmona, ocupava o cargo de senador na República de Veneza. Era um homem rico e mostrou ser totalmente contraditório: antes do casamento de sua filha com Otelo, ele foi recebido várias vezes em sua casa. Depois disso, acusou-o de feitiçaria e teve a intenção de matá-lo. No entanto, quem veio a falecer foi o próprio Brabâncio.

Emília - mulher de Iago e serviçal de Desdêmona. A princípio sua participação na peça é discreta, mas no final ganha importância. Em nome da honra de sua senhora ela enfrenta o marido, revelando a Otelo que Iago o estava enganando.

2- Tempo

Na obra Otelo existe o predomínio do tempo psicológico. Isso ocorre devido aos vários monólogos existentes na peça. Esse recurso era muito usado no teatro para revelar o que os personagens estavam pensando. A maioria dos monólogos da obra Otelo é feita por Iago que nos revela toda a interioridade de sua alma tenebrosa. Quando isso ocorre quebra a cronologia do tempo cuja passagem é marcada pela fala dos personagens e, como isso é feito de forma muito sutil, é difícil identificá-lo.
O primeiro ato dura uma noite. Entre esse ato e o seguinte existe um intervalo de cerca de uma semana, tempo que durou a viagem de Veneza a Chipre: "em companhia ele a mandou do destemido Iago, cuja vinda ultrapassa nossos cálculos de uma semana". O segundo ato era uma noite. Inicia-se quando os navios desembarcaram em Chipre e termina na noite desse mesmo dia com Iago incentivando Cássio a procurar Desdêmona para que ela intercedesse a seu favor junto a Otelo: "... logo que amanhecer, vou pedir à virtuosa Desdêmona que interceda a meu favor...".
O ato III inicia-se no dia seguinte: "Então não vos deitastes? - Oh, não! Raiou o dia quando nos separamos...". Acreditamos que esse ato dure um pouco mais de uma semana. Essa idéia é apoiada na fala de Bianca que se dá no final desse ato: "E a vossa casa eu também ia, Cássio. Uma semana ausente? Sete dias e sete noites...". Por meio dessa fala deduzimos que Cássio, quando chegou à ilha, foi visitar sua amante.
Os atos de IV e V duram um dia e uma noite. A fala de Bianca no final do ato III nos dá uma identificação de que esse ato termina durante o dia: "... acompanhai-me um pouco e declarai-me se ainda vos verei antes da noite!". Depois disso não há na obra mais indicações de que os dias se passaram, o que existe são apenas trechos que indicam que anoiteceu: "... é noite alta!" e "Desdêmona dorme, no leito. Uma candeia acesa. Entra Otelo". Com base nos dados do levantamento acima, acreditamos que o tempo interno da obra dure aproximadamente 24 dias.

3- Espaço

O espaço em Otelo não é muito relevante. O primeiro ato da obra ocorre em Veneza e os demais na ilha de Chipre. Em Veneza os espaços são a rua da casa de Brabâncio, uma outra rua não identificada e a Câmara do conselho. Em Chipre, a primeira cena ocorre perto do cais, as demais se dão em ruas não identificadas, diante e em quartos do castelo. Na obra existem espaços abertos e fechados, mas as cenas de maior tensão ocorrem em espaços fechados, como exemplo, podemos citar as mortes de Desdêmona, Otelo e Emília. O espaço também é fechado quando Iago articula seus planos malignos. Às vezes isso se dá nas ruas, espaços abertos, mas a escuridão da noite dificulta a visibilidade e esse espaço torna-se fechado. Iago é um ser tão maquiavélico que usa os espaços para executar seus planos. Ele se aproveita dos espaços fechados para induzir Cássio a envolver-se numa briga. Depois ele usa esse mesmo tipo de espaço para matar Rodrigo e ferir Cássio e ainda na cena em que Iago faz Otelo ouvir apenas parte de sua conversa com Cássio, dando-lhe a impressão que Desdêmona o havia traído.

4- Ideologia

Nessa tragédia são encontradas várias idéias muito interessantes que, em sua maioria, fazem parte do nosso cotidiano:
I.) Preconceito racial e religioso:
O preconceito racial se faz presente em quase toda a obra. É fácil encontrar trechos em que outros personagens zombam de Otelo por causa da sua cor.
" Iago - ... Agora mesmo, neste momento, um velho bode negro está cobrindo vossa ovelha branca... / ... Quereis que vossa filha seja coberta por um cabalo berbére e que vossos netos relinchem atrás de vós?".
O preconceito religioso é percebido nas falas de Otelo e de Rodrigo:
"... e cuja mão, tal como um vil judeu, jogou fora uma pérola mais rica que toda a sua tribo... / cão circuncidado".
A circuncisão é uma operação que retirava parte do prepúcio, pele que envolve o pênis. Esse tipo de cirurgia é feita pelo povo judeu para serem confirmados na religião. No Novo e no Velho Testamentos, sempre que é usado o termo circuncidado, faz-se referência aos judeus.

II.)  Contraste entre a realidade e as aparências:
Iago aparentava ser uma pessoa boa e digna de confiança, mas ele mostrou ser justamente o oposto, ou seja, maligno e traidor, pois o fascínio pelo poder, que vêm a ser o mesmo que o fascínio pelo mal, é inato ao ser humano. De certo modo, a arte de Shakespeare, manifestada através da ruína de Otelo nas mãos de Iago, é por demais sutil para ser parafraseada no ato crítico. Iago insinua a infidelidade de Desdêmona, primeiramente, sem o fazer de maneira direta, apenas cercando a questão de um lado e de outro:
"Que a boa fama, para o homem, senhor, como para a mulher, é a jóia de maior valor que se possui. Quem furta a minha bolsa me desfalca de um pouco de dinheiro...".

III) Ciúme injustificado:
Otelo sentia ciúme de sua mulher, sem que ela nunca lhe desse motivos. Foi esse ciúme doentio que permitiu que Iago o enganasse. O grande "insight" de Shakespeare com relação ao ciúme masculino é que o mesmo se trata de uma máscara que oculta o medo de castração na morte. Os homens acham que para eles jamais haverá tempo e espaço suficientes, e encontram na questão da infidelidade feminina, real ou imaginária, um reflexo do próprio fim, a constatação de que a vida há de continuar sem eles e Otelo se torna tão vulnerável. "Por que me casei?", ele exclama, e aponta os próprios "cornos" quando diz a Desdêmona: "Dói-me a cabeça aqui", o que a pobre esposa, inocente, atribui ao cansaço, tendo Otelo passado a noite cuidando do governador ferido.

IV) A união de uma mulher branca com um mouro:
Isso para a época, era uma situação pouco comum e que, se ocorresse de fato, escandalizaria a sociedade, e no pleno desempenho de suas funções, Otelo estaria imune ao charme de Desdêmona, e à franca paixão da jovem pelo mito que ele representava.

V) Crítica Política:
Esse tipo de crítica pode ser visto quando Brabâncio chama Iago de vilão e ele, ironizando, chama-o de senador: "Brabâncio - Sois um vilão! / Iago - E Vós... um senador!".

VI) Visões Oníricas (sonhos)
Observando a leitura de Jorge Luis Borges, podemos constatar a importância dos sonhos e premonições na literatura inglesa, basta observar as histórias de Chaucer que descobriu sua vocação num sonho e de Coleridge que sonhou com a construção de um poema sobre um palácio de Kubla Khan, imperador do Oriente que sonhou o palácio que desejava arquitetar; e Shakespeare utiliza desse recurso em três momentos: o sonho angustiante de Brabâncio, as visões de Otelo a cerca de Desdêmona e a premonição de Desdêmona no leito de morte ao cantar uma canção fúnebre.

Ufa! É muita coisa para ler...mas é grandioso todo o texto e como ele se configura!
Espero que tenham ajudado!
Beijocas coloridas!
Claudinha.

RESUMO DA OBRA OS MISERÁVEIS E ATIVIDADES

 Os Miseravéis – Victor Hugo


Os Miseráveis é um clássico da literatura francesa escrito no século XIX. É um livro que trata de vários temas referentes a questões morais. Trata também questões sentimentais e principalmente fala sobre as injustiças sociais.

O livro tem como personagem principal Jean Valjean, ex-presidiário, rancoroso, que por roubar pão para ajudar uma família cumpriu pena por 19 anos nas Gales. Gales, eram barcos movidos a remo onde os remadores trabalhavam acorrentados e recebiam um soldo mínimo que ficava guardado até libertarem-nos Ao sair do presídio Jean tentou levar uma vida honesta, buscou por vários trabalhos, mas quando conseguia, recebia menos que os demais, isso devido a sua condição de ex-presidiário. Por isso tentou buscar outra cidade, mas chegando lá, ao tentar alojar-se, seus proprietários faziam uma consulta cadastral, onde ao obterem a resposta de que era um ex-detento, não deixavam-no sequer hospedar-se mesmo pagando. Isso o deixava revoltado.

Uma senhora vendo-o a noite deitado no banco da praça a noite, levou-o até a Casa Paroquial, onde o Bispo o recebeu generosamente. Jean pensou que ele era um simples padre e foi logo contando seu problema. Por sua vez, o Bispo com sua índole elevada acolheu-o de bom coração sem julgá-lo. Na Casa Paroquial havia riquezas em objetos como castiçais de prata, usados nos rituais eucarísticos. Ao acordar de madrugada, Jean recordando a sua história e vida amarga, começo a pensar nas riquezas que havia no cofre que ficava aberto e decidiu roubar-lo. Assim cuidadosamente abriu o armário e guardou os utensílios de prata no saco em seguida pulou a janela e fugiu. Desconfiados os policiais da cidade o prenderam portando aqueles objetos e o levaram ao reconhecimento do Bispo. Perguntando se Jean o havia roubado. O Bispo em um gesto nobre e para não prejudicá-lo disse que havia doado os utensílios de parta, para que Jean vendesse e pudesse usar para recomeçar a sua vida tornando-se um homem honesto e de bem.
Libertaram-no e devido aquele ato nobre Jean agradeceu e partiu pensativo. Em suas perambulações conheceu várias pessoas que seriam importantes em algum momento em sua vida. Assim ele mudou de cidade, vendeu os utensílios e montou uma fábrica usando outro nome. Lá conheceu Fantine que contou tudo de sua vida a ele que prometeu ajudá-la.

Fantine antes de morrer havia dito que tinha uma filha que devido as circunstancias vivia em casa de uma família chamada Ostenardier, pessoas essas de índole duvidosa e gostaria que a buscasse. Fantine faleceu e neste meio tempo Jean foi ao encontro desta família encontrando Corsette. Ele a levou e a criou e ela o chamava de pai. Mesmo sendo empresário ,devido a estar em uma cidade onde poucos o conheciam, havia um policial que o perseguia e vigiava em busca de descobrir algo sobre sua vida. Esse policial chamava-se Javert.

 Assim Jean tentava levar uma vida simples para não chamar muita atenção com sua filha Corssete e como Javert vivia perseguindo-o ele resolveu buscar ajuda com um senhor que em momentos outros de sua vida, necessitou de sua ajuda. O senhor Fauchelevent retribuiu o favor escondendo-os no Convento e conseguindo um abrigo para que morassem. Jean tornou-se jardineiro do convento, sua filha Corsette estudava como aluna bolsista do convento e assim ficaram cerca de 10 anos ocultos e livres da perseguição do policial .

Corsette cresceu e tornou-se moça conheceu Marius e mais tarde casou-se com ele. Marius investigando a vida do sogro descobriu que ele era ex-presidiário e proibiu as visitas da filha que Jean havia criado com todo o carinho. Ambos ficaram afastados do convívio e sofreram muito por isso por anos a fio.
Marius acreditava que Jean havia matado o policial que o perseguia e roubara o empresário tomando posse dos seus pertences, sem saber que o empresário era ele próprio só que com outro nome. Certo dia, Marius recebeu a visita do senhor Thenard que lhe contou a verdade. O policial havia sido morto pelo delegado e o senhor Madeleine era na verdade o senhor Jean. E contou-lhe principalmente que o senhor Jean havia salvado sua vida nas barricadas. Arrependido, encaminhou-se junto a Corsette a casa de Jean que doente estava já a um passo da morte.

Marius, pediu-lhe perdão e Jean o perdoou. Corsette e Jean não tinham sequer palavras, pois estavam longe há anos. Mais o amor de ambos era sólido. Jean havia falado que sempre estava a vê-la mesmo que distante e que a saudade o devorava. Jean avisou que não havia mais tempo esta já a retirar-se da vida sendo chamado por Deus.

Jean no final de sua vida, resignado e libertado de seu rancor, perdoou e falou de sentimentos nobres para filha e Marius principalmente do amor de ambos e ao próximo como a si mesmo. Ao falecer ele disse estar enxergando um padre.

Na verdade, o padre que acompanhava a sua passagem e que ele enxergava era o mesmo que lhe auxiliou a uma vida destinada a ajudar aos outros a ter sentimentos puros e nobres e a combater as injustiças sociais. Mostrando que devemos transformar nossos sentimentos negativos dando lugar a sentimentos generosos.


ATIVIDADES

1- Você conheceu o resumo da obra. Após a conversa com a professora em sala e com os colegas, responda: Na história toda, o erro era só de Jean Valjean ? Era igualmente grave o fato de ele, operário, não ter trabalho e não ter pão. Depois de a falta ter sido cometida e confessada, por acaso o castigo não foi por demais feroz e excessivo? Comente.

2- Onde haveria mais abuso: da parte da lei, na pena, ou da parte do culpado, no crime? Não haveria excesso de peso em um dos pratos da balança, justamente naquele em que está a expiação? Por que o exagero da pena não apagava completamente o crime, quase que invertendo a situação, substituindo a falta do delinqüente pela da Justiça, fazendo do culpado a vítima, do devedor credor, pondo definitivamente o direito justamente do lado de quem cometeu o furto?  Comente.

3- Pode a sociedade humana ter o direito de sacrificar seus membros, ora por sua incompreensível imprevidência, acorrentando indefinidamente um homem entre essa falta e esse excesso, falta de trabalho e excesso de castigo? Não era, talvez, exagero a sociedade tratar desse modo precisamente os seus membros mais mal dotados na repartição dos bens de fortuna, e, conseqüentemente, os mais dignos de atenção? Comente.

4- É próprio das sentenças em que domina a impiedade, isto é, a brutalidade, transformar pouco a pouco, por uma espécie de estúpida transfiguração, um homem em animal, às vezes até em animal feroz. As sucessivas e obstinadas tentativas de evasão, bastariam para provar o estranho trabalho feito pela lei sobre a alma humana. Jean Valjean renovou as fugas, tão inúteis e loucas, toda vez que se apresentou ocasião propícia, sem pensar um pouquinho nas conseqüências, nem nas vãs experiências já feitas. Escapava impiedosamente, como o lobo que encontra a jaula aberta. O instinto lhe dizia: "Salve-se". A razão lhe teria dito: "Fique"! Mas, diante de tentação tão violenta, o raciocínio desaparecia, ficando somente o instinto. Era o animal que agia. Quando era novamente preso, os novos castigos que lhe infligiam só serviam para torná-lo mais sobressaltado. Comente.

5-  A história é sempre a mesma. Essas pobres criaturas, QUE JÁ PASSARAM E PASSAM PELA MESMO PROBLEMÁTICA DE JEAN, HOJE, EM DIA, carecendo de apoio, de guia, de abrigo, ficam ao léu, quem sabe até, indo cada uma para seu lado, mergulhando na fria bruma que absorve tantos destinos solitários, mornas trevas onde, na sombria marcha do gênero humano desaparecem sucessivamente tantas cabeças desafortunadas. Compare a história narrada com a realidade atual brasileira e faça um paralelo com a sociedade realista.

Lembrem-se Queridos: a obra é Romântica/Realista. Reflitam sobre a transição Romântismo/Realismo e as três instituições criticadas no Realismo: Igreja, Casamento e Sociedade Burguesa. Leiam os questionamentos e escrevam com as palavras de vocês! Vou considerar muito!

Sucesso!

Beijocas multicores!
Claudinha.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

OBRA DO PAS - A PELE DO LOBO


Olá, Povinho!

Para a turma do 1º Ano "E"...mais um vídeo, agora, da obra "A pele do Lobo" - Arthur Azevedo



Não deixem de  ver o vídeo e baixar a obra, gratuiramente, pelo domínio público!

3º BIMESTRE...

Ufa! Já entramos no 3º Bimestre...hora de abrir o olho e estudar, Galerinha! Muita gente pendurada comigo, hein?

Para o 1º Ano "E"...um vídeo sobre a obra A alma encantadora das ruas - João do Rio


Deliciem-se! Ótimo final de semana!

domingo, 22 de julho de 2012

PARA A PROVA II ... ATENÇÃO!

A MORENINHA - JOAQUIM MANUEL DE MACÊDO

Análise da obra

A Moreninha é um dos principais romances brasileiros e seu autor, ao lado de Manuel Antonio de Almeida, José de Alencar, Machado de Assis, Aluísio Azevedo e outros (poucos) é um dos mais importantes autores da língua portuguesa.
Este livro, centrado no romance entre Augusto e Carolina, é um dos pilares de nossa literatura. Numa época onde a cultura era totalmente voltada para a Europa, A Moreninha é uma das primeiras e magníficas tentativas de fazer literatura brasileira, observando usos e costumes do Brasil do Segundo Império, retratando o cotidiano da vida brasileira em meados do século passado. Joaquim Manuel de Macedo (1820-1881) era médico, mas jamais exerceu a profissão, tendo dedicado sua vida à literatura, à imprensa e ao teatro.
A obra retrata as características do movimento literário a que pertence à medida que possui espírito romântico (final feliz), nostalgia medievalista (indianismo), idealismo, culto à natureza, cristianismo (Festa de San’t Ana), sentimentalismo, linguagem popular e liberdade criadora. Retrata também  uma realidade fantasiada presente no autor.

Tempo / Espaço / Ação

O tipo de ambiente predominante é físico. Foram encontradas algumas descrições interessantes, a que mais nos agradou foi: "A Ilha de... é tão pitoresca como pequena. A casa da avó de Filipe ocupa exatamente o centro dela. A avenida por onde iam os estudantes a divide em duas metades, das quais a que fica à esquerda de quem desembarca, está simetricamente coberta de belos arvoredos, estimáveis, ou pelo aspecto curioso que oferecem. A que fica à mão direita é mais notável ainda; fechada do lado do mar por uma longa fila de rochedos e no interior da ilha por negras grades de ferro, está adornada de mil flores, sempre brilhantes e viçosas, graças à eterna primavera desta nossa boa Terra de Santa Cruz."

A seqüência narrativa e a ação dos personagens se dão em tempo linear - trinta dias. Os eventos narrados desenrolam-se durante os trinta dias pelos quais a aposta era válida. A aposta foi feita em 20 de julho de 1844, uma segunda-feira, e termina no dia do pedido de casamento, 20 de agosto do mesmo ano.

Existe um recuo ao passado. Quando a história se inicia, Augusto está no quinto ano de Medicina e conquistara, entre os amigos, a fama de inconstante. Nos capítulos VII e VIII, o autor conta-nos a origem da instabilidade amorosa do herói. Tudo começara há oito anos, quando Augusto contava 13, e Carolina 7 anos de idade.

Foco narrativo

O narrador, na verdade, é Augusto, pois perdeu a aposta feita com Filipe; mas é narrado na 3ª pessoa, por um narrador onisciente. Aqui e ali, ele se intromete um pouco na história, bancando o moralista.

A importância para a obra e a repercussão no leitor é que a utilização deste tipo de narrador causa o aprofundamento psicológico das personagens, o que não ocorreria se o narrador não fosse onisciente ou em 1ª pessoa. A seqüência narrativa e a ação dos personagens se dão em tempo cronológico pois ocorrem em três semanas e meia.

Temática / Crítica social

O tema da obra é a fidelidade ao amor de infância.

Como crítica social vemos o casamento, pois, na época o ajuste matrimonial era feito pelos pais dos jovens. A união dos filhos ganhava, pois, conotações de negócio indissolúvel, tratado com a seriedade dos adultos pensantes, conseqüência clara do amor arrebatador dos jovens; vemos também referência à escravidão embora sem grande relevo. Mas há, em A Moreninha, referência ao trabalho escravo e aos castigos corporais a que os negros eram submetidos.

Personagens

As personagens mais importantes são Augusto e Carolina. A personagem que mais chama atenção é Augusto que era um estudante de medicina alegre, jovial e inconstante em seus amores. O autor lhe confere complexidade já que no início da história o personagem é descrito de uma forma e no final dela é descrito de outra.

A personagem central é D.Carolina, menina de quatorze anos,  possuía cabelos negros, olhos escuros, era travessa, inteligente, astuta e persistente na obtenção de seus intentos.

Enredo

O enredo apresenta unidade e organicidade pois a história possui início, meio e fim. O clímax do enredo ocorre quando D.Carolina revela a Augusto, ao deixar cair um breve contendo um camafeu, que é a mulher a quem ele tinha prometido se casar na sua infância. O desfecho dá-se no final da história.

Augusto, Leopoldo e Fabrício estavam conversando, quando  Filipe chegou e os convidou para passar um fim de semana na casa de sua avó  que ficava na Ilha de Paquetá. Todos ficaram empolgados,  menos Augusto.  Filipe comentou a respeito de suas primas e de sua irmã, que provavelmente  estariam na ilha. Foi quando surgiu uma discussão que deu origem a um  aposta; Filipe desafiou Augusto dizendo que se ele não se apaixonasse  por  uma das moças ali presentes, no prazo de um mês, seria obrigado a escrever um romance sobre sua história.

Passaram-se quatro dias, Augusto recebeu uma carta, que lhe  foi entregue por seu empregado Rafael, a mando de Fabrício. A carta dizia  que o namoro de Fabrício com D.Joaninha  não estava indo muito bem, pois ela era muito exigente. Ela fazia-lhe pedidos absurdos como escrever quatro cartas por semana , passar quatro vazes ao dia em frente à sua casa e nos bailes ele teria  que usar um lenço amarrado em seu pescoço , da mesma cor da fita rosa presa a seus cabelos. Terminando a leitura, Augusto começou  a rir porque era ele quem sempre aconselhava Fabrício em seus namoros.

Na manhã de sábado, chegou à ilha e encontrou seus amigos, que  estavam a sua espera. Entrando na casa, se dirigiu à sala e se apresentou, em seguida foi procurar um lugar para sentar-se perto das moças. Foi então que ele se deparou com D.Violante, que lhe ofereceu um assento. Ela falou por várias horas sobre suas doenças, e perguntou o que ele achava.  Augusto já irritado de ouvir tantas reclamações, disse que ela sofria apenas de hemorróidas. D.Violante se irritou, afirmando que os médicos da atualidade não sabem o que falam.

Fabrício chegou interrompendo a conversa e chamou Augusto para um diálogo em particular. Os dois começaram a discutir sobre a carta, pois Augusto disse que não pretendia ajudá-lo  em seu namoro com D.Joaninha. Fabrício então declarou guerra  a Augusto.

Logo após a discussão, chegou Filipe chamando-os para o jantar. Na mesa, após todos terem se servido, Fabrício começou a falar em tom alto, dizendo que Augusto era inconstante  no amor. Ele, por sua vez, não respondeu as provocações, mas, na tentativa de se defender, acabou agravando ainda mais a sua situação perante todos.

Após o jantar, foram todos passear no jardim e Augusto foi isolado por todas as moças. Apenas  D.Ana aceitou passear com ele. Augusto quis dar explicações à D.Ana, mas preferiu ir a um lugar mais reservado. Ela sugeriu então que fossem até uma gruta, onde sentaram num banco de relva.

Começaram a conversar e Augusto contou sobre seus antigos amores e entre eles do mais especial, que foi aos treze anos, quando viajando com seus pais  conheceu uma linda garotinha de oito anos, com quem brincou  muito na praia, quando um pobre menino pediu-lhes ajuda. Eles foram levados a uma cabana onde estava um velho moribundo a beira da morte. Sua mulher e seus filhos estavam chorando. As crianças comovidas deram todo o dinheiro que possuíam à mulher do pobre velho. O velho agradeceu e pediu de cada um deles um objeto de valor. O menino deu-lhe um camafeu de ouro que foi envolvido numa fita verde e a menina deu-lhe um botão de esmeralda que  foi envolvido numa fita branca, transformando-os em breves. O camafeu ficou com a menina e a esmeralda com o menino.

Depois trocados os breves, o velho os abençoou e disse que no futuro  eles se reconheceriam pelos breves e se casariam. Foram embora e a menina saiu correndo de encontro a seus pais sem ter revelado o seu nome, e a partir  daquele momento nunca mais se viram. Acabada a história Augusto levantou-se para tomar água. Ao pegar um copo de prata foi interrompido por D.Ana que resolveu lhe contar a história da gruta, que era a lenda de uma moça  que se apaixonara por um índio que não a amava  e de tanto ela chorar, deu origem a uma fonte, cuja água era encantada. Disse também que quem bebesse daquela água teria o poder de adivinhar os  sentimentos alheios e não sairia da ilha sem se apaixonar por alguém. D.Ana explicou também que a moça cantava uma canção muito bela, quando de repente eles escutaram uma linda voz. Augusto perguntou a D.Ana de onde vinha aquela melodia e ela explicou que era Carolina que cantava sobre a pedra de gruta e ele ficou encantado.

Logo após o passeio, foram todos até a sala para tomar café e a Moreninha derramou o café de Fabrício sobre Augusto. Ele foi se trocar no gabinete masculino quando Filipe entrou e sugeriu que ele fosse se trocar no gabinete feminino, para que pudesse ver como era.

Augusto aceitou e enquanto se trocava, ouviu vozes das moças que iam em direção ao gabinete. Ficou apavorado, pegou rapidamente as roupas e se enfiou debaixo de uma cama. As moça entraram, sentaram-se e começaram a conversar sobre assuntos particulares. O rapaz ouviu toda a conversa e quase não resistiu ao ver as pernas bem torneadas de Gabriela na sua frente. De repente ouviram um grito e Joaninha disse que a voz parecia com a de sua prima D.Carolina. Todos saíram correndo para ver o que estava acontecendo e Augusto aproveitou para terminar de se trocar e saiu do gabinete para ver a causa daquele grito.

O grito era da Moreninha que viu sua ama D. Paula caída no chão, devido a alguns goles de vinho que tomou junto do alemão Kleberc. D.Carolina não queria acreditar que sua  ama estivesse bêbada e levaram-na para o quarto. A Moreninha estava desesperada quando Augusto, Filipe, Leopoldo e Fabrício entraram no quarto e percebendo a embriaguez da velha senhora começaram a dar diagnósticos absurdos. D.Carolina só acreditou em Augusto e não aceitou o verdadeiro motivo do mau estar de sua ama. Todos saíram do quarto e se dirigiram até o salão de jogos. Augusto foi conversar com D.Ana e perguntou sobre o paradeiro da Moreninha. D.Ana disse que ela estava no quarto cuidando de sua ama. Augusto foi até até o aposento e chegando na porta viu uma cena inesquecível; ela lavava com suas delicadas mãos os pés de sua ama e ele comovido se ofereceu para ajudá-la. Depois disso Augusto sugeriu que a deixasse repousar pois no dia seguinte estaria bem.

D.Carolina foi se trocar para em seguida ir ao Sarau, colocou um vestido muito bonito mas fora dos padrões normais, pois mostrava parte de suas pernas. Todos queriam dançar com ela e Fabrício  pediu-lhe a terceira dança, mas a garota mentiu dizendo que iria dançar com Augusto. Ele por sua vez dançou com todas as moças e jurou-lhes amor eterno, inclusive para a Moreninha. No fim da festa Augusto encontrou um bilhete que estava  em seu paletó, dizendo para ir à gruta no horário marcado e logo após encontrou outro no qual dizia que aquilo era uma armadilha.

No dia seguinte, Augusto foi até a gruta no horário marcado e encontrou as quatro jovens e antes que elas pudessem falar, foram surpreendidas pelo rapaz que contou cada uma o que ouvira no gabinete. As moças ficaram revoltadas e depois de irem embora Augusto foi surpreendido pela Moreninha que começou a contar a conversa dele com D.Ana. Mas primeiro ela tomou um copo da fonte e foi por este motivo que Augusto ficou mais impressionado pois lembrou-se da lenda da fonte encantada, e logo depois do susto, declarou-se a ela.

Depois de acabadas as comemorações, as pessoas voltaram para suas casas. Augusto não se cansava de contar sobre D.Carolina para Leopoldo, que sempre dizia que aquilo era amor. Os rapazes acharam conveniente visitar D.Ana, Augusto se encarregou dessa tarefa no domingo.

D. Ana foi recebê-lo e contou-lhe que D.Carolina estava triste até saber se sua vinda para a ilha. Durante o almoço Augusto viu um lenço na mão de D.Carolina  e adivinhou que ela o tinha bordado e após muita conversa D.Carolina resolveu ensiná-lo a bordar.

Depois do almoço, Filipe e Augusto foram jogar baralho, quando ouviram o chamado da Moreninha para a primeira aula de bordado. A lição acabou ao meio dia e Augusto achou prudente ir embora, despediu-se de todos e combinou com D.Carolina, que no domingo seguinte voltaria e traria o lenço já terminado.

No domingo seguinte, Augusto voltou até a ilha  e levou o lenço totalmente pronto, para que sua mestra pudesse o ver, ela não acreditou que ele fizera um trabalho tão bem feito e começou  a chorar, dizendo que ele tinha outra mestra. Augusto tentou explicar-se de todas as maneiras possíveis, e disse que o lenço fora comprado de uma velha senhora.

Depois de muita insistência a Moreninha aceitou a situação, pois D.Ana disse-lhe que sua atitude era infantil.

Depois do incidente Augusto chamou a Moreninha para um passeio e percebeu que ela estava um pouco nervosa, foi então, que ele perguntou-lhe se havia um amor em sua vida, ela respondeu com a mesma pergunta e Augusto disse que o grande amor de sua vida era ela. A Moreninha ficou imóvel e disse que o seu amor poderia ser ele.

Augusto voltou para sua casa e foi proibido de voltar à ilha por seu pai pois seus estudos estavam sendo prejudicados. D.Carolina não era mais a mesma desde a partida de Augusto que agora estava em depressão. Seu pai, vendo que estava prestes a perder seu filho, achou melhor que Augusto voltasse à ilha  e pedisse a mão da Moreninha em casamento.

Chegando próximo à ilha, viram a Moreninha cantando sobre a pedra, e ela ao vê-los ignorou-os. D.Ana foi recebê-los e o pai de Augusto explicou a situação se seu filho. Eles foram até a sala e de repente a Moreninha apareceu com seu vestido branco chamando a atenção de todos, foi então que o pai de Augusto fez o pedido diretamente a Moreninha, pois seu filho não tinha coragem o suficiente. A moça ficou assustada e disse que daria a resposta mais tarde na gruta mas D.Ana disse ao pai de Augusto que não se preocupasse, pois a resposta seria sim.

Augusto, ansioso, foi até a gruta e chegando lá encontrou a Moreninha, os dois conversaram e ela perguntou se ele ainda amava a menina da praia. Ele disse que não pois seu amor pertencia somente a ela. Ela disse que não poderia se casar pois ele já estava comprometido com outra pessoa. Irritado, ao sair da gruta foi surpreendido quando ela lhe mostrou o breve verde. Augusto não agüentou a emoção e pegando o breve ajoelhou-se aos pés da Moreninha, começando a desenrolar o breve reconhecendo o seu camafeu.

O pai de Augusto e D.Ana entraram na gruta e não entenderam o que estava acontecendo, acharam que os dois estavam malucos e Augusto dizia que encontrara sua mulher e a Moreninha por sua vez dizia que eles eram velhos conhecidos. Logo após Filipe, Leopoldo e Fabrício viram a alegria do novo casal, mas Filipe foi logo dizendo que já se passaram um mês, Augusto perdera a aposta e deveria escrever um romance.

Augusto surpreende a todos dizendo que o romance já estava pronto e se intitulava  A Moreninha.

domingo, 15 de julho de 2012

SITE DO DOMÍNIO PÚBLICO

Eis o site do Domínio Público: http://www.dominiopublico.gov.br/
Lá você poderá baixar obras completas de forma gratuita!
Viu, aluninhos queridos? Para o 1º ano "E": "A alma encantadora das ruas" - João do Rio. Para os 2ºs anos: "Dom Casmurro" de Machado de Assis e "Os Miseráveis" de Victor Hugo. Obras do PAS!

sexta-feira, 13 de julho de 2012

SOMENTE PARA O 1º ANO "E"

Meus queridos alunos do 1º ano "E", eis o resumo da obra "A Alma encantadora das ruas" de João do Rio.

Em 1908, iluminada pelas primeiras luzes da modernidade, o Rio de Janeiro já se revelava, aos olhos mais sensíveis, como uma cidade multifacetada, fascinante, efervescente na democracia da ruas. Nesse ano, um cronista lança o livro "A alma encantadora das ruas", em que observa, deslumbrado, as novas relações sociais que se desenham no coração daquela seria mais tarde chamada a Cidade Maravilhosa. Seu nome: João do Rio.

A essência da identidade carioca já está presente nas linhas críticas e bem-humoradas deste João: a capacidade de criar soluções de sobrevivência, a paixão pela música, a riqueza do imaginário social, a espontaneidade da mistura cultural que constitui hoje a maior riqueza não apenas do Rio, mas de todo o Brasil.

O livro aborda questões aleijadas da sociedade, como os trabalhadores, as cadeias e ladrões, unindo os fragmentos do Rio de Janeiro da época.

"A alma encantadora das ruas" é o terceiro livro desse escritor e foi publicado em 1908 pela Editora Garnier, tornando-se rapidamente um sucesso de vendas. Embora seu título lembre El alma encantadora de Paris (1902) do nicaraguense Enrique Gomez Carrillo, pela sua temática, está bem mais próximo de Les petites choses de Paris (1888) de Jean de Paris (pseudônimo do jornalista do Le Figaro Napoléon-Adrien Marx) e de Paris inconnu (1878) de Alexandre Privat d''Anglemont. É, no entanto, é uma obra única e bem carioca, e não surpreende que tenha se transformado num clássico, enquanto os seus congêneres estrangeiros caíram no esquecimento, mesmo nos seus países de origem.

O que mais nos espanta nessa obra singular (talvez a mais interessante até hoje escrita sobre a cidade do Rio de Janeiro e sua população), mais ainda do que o brilhantismo do estilo, é a sua homogeneidade, ainda mais quando sabemos que é uma antologia de textos publicados anteriormente pelo autor entre 1904 e 1907 no jornal A Gazeta de Notícias e na revista Kosmos. No entanto, tudo flui tão naturalmente que temos a ilusão de estar lendo um livro escrito de um fôlego só.

Dividido em cinco partes, "A alma encantadora das ruas" inclui, na abertura e encerramento, duas conferências proferidas pelo autor em 1905: A rua e A musa das ruas (anteriormente intitulada Modinhas e cantigas). Estão entre os textos mais burilados e profundos de João do Rio, e tornaram-se por assim dizer, exemplares sobre os assuntos que abordam. As outras três partes são compostas basicamente de reportagens, magníficos exemplos desse gênero, que o autor praticamente introduziu no jornalismo nacional. O que se vê nas ruas aborda as pequenas profissões dos biscateiros que perambulavam pelas ruas da cidade na virada do século: tatuadores, vendedores de livros e orações, músicos ambulantes, cocheiros, pintores de tabuletas de lojas comerciais e paisagens de parede de botequim; e também as festas populares da Missa do Galo, Dia de Reis e Carnaval. Dois desses textos (Visões d''ópio e Os cordões) extrapolam o gênero da reportagem e entram no da crônica. O mesmo pode dizer de As mariposas do luxo, que abre a terceira parte, intitulada Três aspectos da miséria. Aqui se aborda principalmente as condições de trabalho dos operários e a mendicância. As reportagens sobre o proletariado (Os trabalhadores da estiva e A fome negra) são pioneiras no assunto, e Antonio Cândido ( vide Radicais de ocasião in Teresina, 1980) ressaltou nelas a abordagem corajosa que nenhum outro autor da virada do século (nem mesmo os auto-proclamados progressistas e revolucionários) se atreveu a repetir. A quarta parte, Onde às vezes acaba a rua compõe-se de seis reportagens entre os presos da Casa de Detenção, que ainda hoje, mais de 90 depois, impressionam pela atualidade.

Escrito durante o governo de Rodrigues Alves, "A alma encantadora das ruas", talvez seja o livro mais conhecido de João do Rio. Em nenhum outro, a cidade aparece tão nitidamente, a ponto de dizermos que nele, a cidade é a protagonisa cena. E, mais importante, neste livro vemos o amadurecimento da linguagem de seu Autor, a ponto de dizermos que um estilo literário se estabiliza. Neste caso, a forma como o escritor capta e procura descrever a cidade, certamente representa aspecto fundamental para a compreensão deste amadurecimento estilístico. Em outras palavras, a cidade, em sua estrutura e em seus níveis de sociabilidade, influencia a criação de um novo estilo literário: o ritmo das crônicas ganha agilidade e variedade, a dicção se aproxima do prosaico para conservar o lirismo (um modo de realçar o que há de ?encantador? nas ruas). Neste livro, vemos João do Rio como o escritor que, reunindo as qualidades do flâneur e do dandy, se sente seduzido pelo mundo que as ruas lhe oferecem, onde nasce um tipo de sentimento inteiramente novo e arrebatador, que carece de compreensão e vivência: o mundo encantador das ruas.

Assim como o homem, a rua tem alma. Algumas dão para malandras, outras para austeras; umas são pretensiosas, outras riem aos transeuntes, e o destino nos conduz como conduz o homem, misteriosamente, fazendo-as nascer sob uma estrela ou sob um signo mal <...> Oh! Sim, as ruas têm alma! Há ruas honestas, ruas ambíguas, ruas nobres, delicadas, trágicas, depravadas, puras, infames, ruas sem histórias, ruas tão velhas que bastam para contar a evolução de uma cidade inteira, ruas guerreiras, revoltosas, medrosas, snobs, ruas aristocráticas, ruas amorosas, ruas covardes, que ficam sem um pingo de sangue (p. 45)

sábado, 7 de julho de 2012

ROMEU E JULIETA

Romeu e Julieta é uma tragédia escrita entre 1591 e 1595, nos primórdios da carreira literária de William Shakespeare, sobre dois adolescentes cuja morte acaba unindo suas famílias, outrora em pé de guerra.
A história tem como cenário a cidade de Verona. Duas famílias poderosas são inimigas mortais: a família Montecchio e a família Capuleto. Vivem em constantes conflitos, os quais perturbam a ordem e a paz da cidade. Tais acontecimentos provocam a ira do Príncipe que determina severa punição aos envolvidos nos conflitos: caso as brigas e provocações não cessassem, seriam punidos com a morte. Romeu, um jovem Montecchio passional e destemido, sofre de amor por Rosalina. Tem como melhores amigos e companheiros Benvólio e Mercúcio. É convidado por estes, no intuito de fazê-lo esquecer Rosalina, a ir ao baile de máscaras dos Capuleto. Romeu encanta-se por uma jovem e bela moça, que descobre ser Julieta Capuleto, que corresponde ao encantamento. Mais tarde, Julieta vai para a varanda e conta às estrelas que tem um amor proibido. Romeu, escondido nuns arbustos por baixo da varanda, ouve as confissões de Julieta e não resiste, decide revelar sua presença e após trocarem juras de amor, marcam o casamento para o dia seguinte. Romeu vai à cela de Frei Lourenço e convence-o a realizar a cerimônia secreta.

Com a ajuda da Ama de Julieta, a cerimônia é realizada. Após a cerimônia, Romeu presencia um duelo entre seus amigos e Teobaldo, um Capuleto, primo de Julieta. Mesmo desafiado Romeu nega-se a lutar, mas Teobaldo mata Mercúcio e Romeu, tomado pela cólera, mata Teobaldo. O Príncipe abranda a punição e permite que Romeu viva, mas resolve bani-lo da cidade para sempre. Romeu refugia-se na cela do Frei Lourenço. Julieta, prometida ao Conde Páris, recebe a notícia dos acontecimentos e mantém-se apaixonada por seu marido. Manda a Ama procurá-lo e entregar-lhe um anel como prova de seus sentimentos. Pede que Romeu vá ao seu quarto durante a noite. Romeu e Julieta passam a noite juntos. A Ama, apesar de ajudá-los tenta convencer Julieta de que Romeu não serve para ela. Julieta zanga-se com a Ama. Romeu parte para Mântua logo pela manhã, após o canto da Cotovia, que simboliza o amanhecer. Enquanto isso, os pais de Julieta resolvem casá-la com o Conde Páris.

Desesperada Julieta pede ajuda ao Frei que a aconselha a aceitar o casamento para despistar seus pais. Dá a ela um frasco de elixir para simular sua morte e montam um plano: Julieta deveria tomar o conteúdo do frasco, sua família acreditaria em sua morte, o casamento com o Conde não se realizaria e o Frei, através de uma carta explicativa, mandaria Romeu voltar para que ficassem juntos. Porém a carta se extravia e Romeu recebe a notícia da morte da amada. Desfeito de dor Romeu compra um veneno e desesperado decide morrer também. Volta à cidade e defronta-se com o Conde no mausoléu onde está Julieta, é forçado a lutar com ele, Travam duelo e Romeu assassina-o. Toma o veneno diante do corpo de Julieta e morre abraçado a ela. Frei Lourenço chega para tentar impedi-lo, mas é tarde, foge para não ser desmascarado e punido, porém antes acorda Julieta e conta a ela o que se passou, que horrorizada decide ficar junto de seu grande amor.

Julieta beija Romeu para tentar absorver o veneno de seus lábios e morrer também, mas sua tentativa é frustrada. Apanha a adaga de Romeu e apunhala-se, morrendo junto de seu marido. A tragédia tem um grande impacto em ambas as famílias (os Montecchio e os Capuleto). As duas famílias estão tão magoadas com a morte dos seus dois únicos descendentes, que perdoam-se mutuamente e juram manter a paz em nome do amor de seus filhos (Romeu e Julieta).

ANÁLISE DETALHADA DA OBRA "LUCÍOLA"

PARA AS "CHORONAS" DO GRUPO DO 2º "D", EIS A ANÁLISE DETALHADA...ESPERO AJUDAR TAMBÉM OS  GRUPOS DE OUTRAS TURMAS!

É LONGO...PACIÊNCIA!

Lucíola é o quinto romance de Alencar e o primeiro da trilogia que ele denominou de "perfis de mulheres" (Lucíola, Diva e Senhora). Situa-se entre seus romances urbanos que representam um levantamento da nossa vida burguesa do século passado. A obra, publicada em 1862, é um romance de amor bem ao sabor do Romantismo, muito embora uma ou outra manifestação do estilo Realista aí se faça presente. Trata-se de um romance de "primeira pessoa", ou seja, o narrador da história é um personagem importante da mesma, Paulo Silva. E ele a narra em cartas dirigidas a uma senhora, G. M. (pseudônimo de Alencar), que as publica em livro com o título de Lucíola. Fixam o  Rio de Janeiro da época, com a sua fisionomia burguesa e tradicional, com uma sociedade endinheirada que freqüentava o Teatro Lírico, passeava à tarde na Rua do Ouvidor e à noite no Passeio Público, morava no Flamengo, em Botafogo ou Santa Teresa e era protagonista de dramas de amor que iam do simples namoro à paixão desvairada.

Em todos os romance urbanos, Alencar aborda o amor como tema central. Ou, para ser mais exato, "aborda a situação social e familiar da mulher, em face do casamento e do amor". Mas o amor como o entendia a mentalidade romântica da época, um amor sublimado, idealizado, capaz de renúncias, de sacrifícios, de heroísmos e até de crimes, mas redimindo-se pela própria força acrisoladora de sua intensidade e de sua paixão.

Subjetivismo - O mundo do romântico gira em torno de seu "eu": do que ele sente, do que ele pensa, do que ele quer. Por isso o poeta e o personagem na ficção romântica estão em contínua desarmonia com os valores e imposições da sociedade e/ou da família.

Em Lucíola encontram-se pelo menos duas grande manifestações desse subjetivismo romântico.

A primeira grande manifestação de subjetivismo está na própria estrutura narrativa do romance. Trata-se de um romance de "primeira pessoa", em que a história é narrada do ponto de vista de uma só pessoa. No caso, Paulo. Tudo gira em torno do que ele viu, pensou, sentiu junto a Lúcia. Tudo, portanto, muito individual. Já no capítulo I, Paulo esclarece que escreveu essas páginas para se justificar perante uma senhora que estranhou "a minha (dele) excessiva indulgência pelas criaturas infelizes, que escandalizam a sociedade com a ostentação do seu luxo e extravagância." Para isso , "escrevi as páginas que lhe envio, as quais a senhora dará um título e o destino que merecerem. É um "perfil de mulher" apenas esboçado."

A segunda considerável manifestação de subjetivismo está na oposição indivíduo x sociedade. No romance, Paulo e Lúcia ora se insurgem contra as convenções sociais: "Que me importa o que pensam a meu respeito?", ora satisfazem essas mesmas convenções, embora sempre reafirmando o próprio "eu" e fazendo a sua personalidade.
- "... Há certas vidas que não se pertencem, mas à sociedade onde existem. Tu  és um celebridade pela beleza. O público, em troca do favor e admiração e que cerca os sue ídolos, pede-lhes conta de todas as sua ações. Quer saber por que agora andas tão retirada."
- "Ah! esquecia que uma mulher como eu não se pertence; é uma coisa pública, um carro de praça que não pode recusar quem chega..."

Exaltação do amor - Em Lucíola, a temática central está exatamente na exaltação do amor como força purificadora, capaz de transformar uma prostituta numa amante sincera e fiel.

"- o amor purifica e dá sempre um novo encanto ao prazer. Há' mulheres que amam toda a vida; e o seu coração, em vez de gastar-se e envelhecer, remoça como natureza quando volta a primavera."
"Tive força para sacrificar-lhes outrora o meu corpo virgem; hoje depois de cinco anos de infâmia, sinto que não teria a coragem de profanar a castidade de minha alma. Não sei o que sou, sei que começo a viver, que ressuscitei agora., disse Lúcia após sentir a afeição de Paulo." 

E o romance termina com esta patética exaltação do amor, balbuciada por uma prostituta regenerada por esse mesmo amor, momentos antes de sua morte: "Eu te amei desde o momento em que te vi! Eu te amei por séculos nestes poucos dias que passamos juntos na terra. Agora que a minha vida se conta por instantes, amo-te em cada momento por uma existência inteira. Amo-te ao mesmo tempo com todas as afeições que se pode ter neste mundo. Vou te amar enfim por toda a eternidade."

Amor e morte - O romance é impregnado da idéia de morte pois Lúcia está continuamente a se queixar de uma doença misteriosa que Paulo não compreende nem aceita, supondo-se tratar-se de refinada desculpa para não se entregar a ele sexualmente. Lúcia não acredita nem admite que uma mulher como ela possa usufruir das alegrias e gozos do amor conjugal, dando ao esposo "o mesmo corpo que tantos outros tiveram". Seria uma profanação do verdadeiro amor. "O amor!... o amor para uma mulher como eu seria a mais terrível punição que Deus poderia infligir-lhe! Mas o verdadeiro amor d'alma."

Diante, portanto, da impossibilidade de realização de um amor puro, só resta a Lúcia, como personagem de um romance genuinamente romântico, uma saída: a morte. Nem mesmo um filho ela merece, pois seria o fruto de um amor vilipendiado. "Um filho, se Deus mo desse, seria o perdão da minha culpa! Mas sinto que ele não poderia viver no meu seio!" E, numa atitude típica de heroína romântica, Lúcia anseia morrer nos braços do homem amado: "Ainda quando soubesse que morreria nos seus braços... Que morte mais doce podia eu desejar!"  "... desejava que fosse possível morrermos assim um no outro... uma só vida extinguindo-se num só corpo!". E assim se fez. Morreu ao lado do ser amado, dizendo-lhe: "vou te amar enfim por toda a eternidade. (...) Recebe-me... Paulo!"

Sentimentalismo melancólico - Em Lucíola um mínimo contratempo é o suficiente para lançar Lúcia ou Paulo na mais profunda tristeza. Numerosas passagens do romance colocam o leitor diante de quadros profundamente melancólicos. Como esta:

"Foi terrível. Meu pai, minha mãe, meus manos, todos caíram doentes: só havia em pé minha tia e eu. Uma vizinha que viera acudir-nos, adoecera à noite e não amanheceu. Ninguém mais se animou a fazer-nos companhia. Estávamos na penúria; algum dinheiro que nos tinham emprestado mal chegara para a botica. O médico, que nos fazia a esmola de tratar, dera uma queda de cavalo e estava mal. Para cúmulo de desespero, minha tia uma manhã não se pôde erguer da cama; estava também com a febre. Fiquei só! Uma menina de 14 anos para tratar de seis doentes graves, e achar recursos onde os não havia. Não sei como não enlouqueci."

E esta outra, onde Lúcia se fez passar por uma amiga morta para aliviar o sofrimento dos pais: "Lúcia morreu tísica; quando veio o médico passar o atestado, troquei os nosso nomes., Meu pai leu no jornal o óbito de sua filha; e muitas vezes o encontrei junto dessa sepultura onde ele ia rezar por mim, e eu pela única amiga que tive neste mundo. Morri pois para o mundo e para minha família. Meus pais choravam sua filha morta; mas já não se envergonhavam de sua filha prostituída."

Muitas das atitudes tomadas por Paulo ou Lúcia são próprias de pessoas que se deixam guiar pelo sentimento. Esta, por exemplo, esquisita e inexplicável de Lúcia "- Iremos juntos!... murmurou descaindo inerte sobre as almofadas do leito. Sua mãe lhe servirá de túmulo."

Enfim, o romance todo, do início ao fim, está impregnado de uma atmosfera melancólico-sentimental.

Ilogismo - Os paradoxos, o comportamento ora excêntrico ora dúbio de Lúcia, ora virtuoso, ora pecaminoso que vai lançando Paulo numa dúvida angustiante: a própria duplicidade comportamental de Paulo, generoso e mesquinho, compreensivo e intransigente, correto e pilantra; tudo isso dá à intriga do romance um atrativo todo especial que, por sua vez, ora atrai ora aborrece o leitor.

Há ainda outras manifestações de Romantismo no romance, tais como, imaginação e fantasia, culto da natureza, senso do mistério, exagero. Mas são de  importância secundária.

Lirismo - Há um lirismo bem bucólico nesta passagem de Lucíola: "Sentamo-nos sobre a relva coberta d flores e à borda de um pequeno tanque natural, cujas águas límpidas espelhavam a doce serenidade do céu azul. Lúcia tirou do bolso seu crochê e o novelo de torçal, e continuou uma gravata que estava fazendo para mim. Enquanto ela trabalhava, eu arrancava as flores silvestres para enfeitar-lhe os cabelos; ou arrastava-me pela relva para beijar-lhe a ponta da botina que aparecia sob a orla do vestido."

E nesta outra há graça, ternura, sentimento: "Toquei com os lábios a raiz daqueles cabelos sedosos que ondulavam com o sopro de minha respiração. Ana teve um estremecimento íntimo; e banhou-se na onda de púrpura que descendo-lhe da fronte, derramou-se pelas espáduas roseando a branca escumilha."

Gosto pela descrição - Em Lucíola, de quando em quando aparece a natureza como a aliviar o leitor das tensões dos dramas humanos.

Quanto à descrição dos personagens, Alencar parece se preocupar antes com o aspecto externo para depois chegar ao temperamento.  Antes mesmo de o leitor saber quem era ela, já Alencar lhe mostrou o retrato de Lúcia no capítulo II: "Admirei-lhe do primeiro olhar um talhe esbelto e de suprema elegância. O vestido que o moldava era cinzento com orlas de veludo castanho e dava esquisito realce a um desses rostos suaves, puros e diáfanos, que parecem vão desfazer-se ao menor sopro, como os tênues vapores da alvorada. Ressumbrava na sua muda contemplação doce melancolia e não sei que laivos de tão ingênua castidade, que o meu olhar repousou calmo e sereno na mimosa aparição." Na passagem seguinte Alencar como que nos conduz do exterior ao interior de Lúcia: "O rosto suave e harmonioso, o colo e as espáduas nuas, nadavam como cisnes naquele mar de leite, que ondeava sobre formas divinas. A expressão angélica de sua fisionomia naquele instante, a atitude modesta e quase íntima, e a singeleza das vestes níveas e transparentes, davam-lhe frescor e viço de infância, que devia influir pensamentos calmos, senão puros."

No que concerne ao vestuário feminino é inegável a influência que Balzac exerceu em Alencar: "Lúcia fitou-se por muito tempo, e chegou-se ao espelho para dar os últimos toques ao seu traje, que se compunha de um vestido escarlate com largos folhos de renda preta, bastante decotado para deixar ver suas belas espáduas, de um filó alvo e transparente que flutuava-lhe pelo seio cingindo o colo, e de uma profusão de brilhantes magníficos capaz de tentar Eva, se ela tivesse resistido ao fruto proibido. Uma grinalda de espigas de trigo, cingia-lhe a fronte e caía sobre os ombros com a vasta madeixa de cabelos, misturando os louros cachos aos negros anéis que brincavam."

Comparações - As comparações de Alencar, geralmente, referem-se aos personagens, ora em seus detalhes físicos, ora em seus estados de alma, ora em seus atributos morais. O segundo termo da comparação é colhido, na esmagadora maioria das vezes, de elementos da natureza: reino vegetal, animal ou mineral. Uma confirmação do que se disse está neste pequeno trecho: "Como as aves de arribação, que tornando ao ninho abandonado, trazem ainda nas asas o aroma das árvores exóticas em que pousaram nas remotas regiões, Lúcia conservava do mundo a elegância e a distinção que se tinham por assim dizer impresso e gravado na sua pessoa."

Desarmonias - Em Lucíola, a luxúria do velho Couto, e mais tarde a prática do vício, torcem a personalidade de Lúcia. A forma refinada desse sentimento da discordância é certa preocupação com o desvio do equilíbrio fisiológico ou psíquico. Relembre-se a depravação com que Lúcia se estimula e castiga ao mesmo tempo, e cujo momento culminante é a orgia promovida por Sá - orgia espetacular, com tapetes de pelúcia escarlate, quadros vivos obscenos, flores e meia luz, ultrapassando o realismo qualquer outra cena em nossa literatura séria.

Dentre muitos exemplos que se poderiam dar de "desarmonia" de situações, está o contraste entre Maria da Glória e Lúcia: aquela, pobre, simples, escondida; esta, rica, caprichosa, pública. Mas isso já é um conflito entre o passado e o presente.. Porém, os contrastes mais importantes na técnica narrativa do livro são aqueles relacionados com pessoas e sentimentos. De Paulo e Lúcia, naturalmente.

A mesma Lúcia que compôs recatadamente o roupão ante os olhos ávidos e voluptosos de Paulo que vislumbravam o simples contorno de um seio foi capaz de desfilar nua na ceia em casa do Sá. Ela é assim: contraditória. Ama e odeia. Atira-se ao vício e tende para a virtude, segundo suas próprias palavras: "Eis a minha vida... deixara-me arrastar ao mais profundo abismo da depravação; contudo, quando entrava em mim, na solidão de minha vida íntima, sentia que eu não era uma cortesã como aquelas que me cercavam. Ficaram gravados no meu coração certos germes de virtudes..."

Também Paulo apresenta um comportamento paradoxal. Ora ele deseja violentamente Lúcia ora promete respeitá-la. Ofende-a e pede-lhe perdão; dá-lhe liberdade e a quer só para si; despreza-a e sente dela pungente ciúme; vê nela uma prostituta refinada e uma menina de quinze anos, pura e cândida. Também Paulo é contraditório: vil e magnânimo, como todo bípede implume e social chamado homem.

Técnica narrativa - Lucíola é um romance de primeira pessoa, ou seja, quem narra a história não é Alencar diretamente. Ele o faz por meio de um personagem que viveu os episódios. No caso, esse personagem narrador é Paulo, que em cartas dirigidas a uma senhora (por quem o autor se faz passar) conta uma história de amor acontecida há seis anos entre ele e Lúcia. A senhora reuniu as cartas e delas fez o livro. "Eis o destino que lhes dou; quanto ao título, não me foi difícil achar. O nome da moça, cujo perfil o senhor me desenhou com tanto esmero, lembrou-me o nome de um inseto. "Lucíola" é o lampiro noturno que brilha de uma luz tão viva no seio da treva e à beira dos charcos. Não será a imagem verdadeira da mulher que no abismo da perdição conserva a pureza d'alma?"

No capítulo I, o narrador explica a razão das cartas: "A senhora estranhou, na última vez que estivemos juntos, a minha excessiva indulgência pelas criaturas infelizes, que escandalizam a sociedade com a ostentação do seu luxo e extravagâncias".

Na estrutura narrativa de Lucíola, portanto, pode-se observar o seguinte:

1. há um autor real, José de Alencar;

2. um autor fictício, a senhora G. M., destinatária das cartas de Paulo.

3. Um narrador, Paulo, com a incumbência e o privilégio de ordenar os fatos, comentá-los e tirar-lhes conclusões.

À medida que transmite os fatos, vai fornecendo ao leitor elementos para a análise de Lúcia e dele mesmo.No romance os fatos são apresentados sob dois pontos de vista, dois ângulos diferentes: o de Paulo/personagem que transmite ao leitor as sensações vividas com Lúcia e o de Paulo/narrador que, por vezes, interrompe a narrativa fazendo reflexões ou dirigindo-se à destinatária de suas cartas.
O enredo abrange um período de aproximadamente seis meses. Foi o que durou o namoro do par romântico. Às vezes, o autor avança a narrativa com soluções bem simples: "Essa vida calma e tranqüila, remanso de uma existência tão agitada, durava cerca de um mês." Em outras, retarda-a: dedicou três capítulos para a ceia em casa de Sá (capítulos VI, VII e VIII).

Ação - Gira em torno de uma história entre Paulo e Lúcia, com todos os ingredientes de um romance romântico: heróis e vilões, heroínas incompreendidas, virgens pálidas e meigas e cortesãs depravadas, a morte como única saída para um amor verdadeiro porém impossível, etc.

Em Lucíola, o núcleo central da narrativa se concentra em Paulo e Lúcia, ora como duas individualidades com passado e presente próprios, ora como o "par romântico". E se concentra com tal intensidade, (afinal o narrador é exatamente Paulo - o herói, o mocinho - que ama a Lúcia - a heroína) que os episódios envolvendo os demais personagens ficam totalmente ofuscados.

Tempo -1855 - "A primeira vez que vim ao Rio de Janeiro foi em 1855". Numa leitura atenta, o leitor percebe no livro o Rio de Janeiro da época de D. Pedro II, com seus salões, sua burguesia, suas vitrinas chiques na Rua do Ouvidor com mercadorias elegantes vindas de Paris ou Londres, seus tílburis, seu vestuário, etc.

Como tempo narrativo, ele é eminentemente "cronológico". Ou seja, em Lucíola os acontecimentos se sucedem numa ordem quase normal, com  uma seqüência natural de horas, dias, meses, anos. Só há um momento em que o fluxo narrativo retroage: quando Lúcia narra a Paulo seu passado. (Cap. XVIII e XIX). E em dois momentos ele avança: o capítulo I e o finalzinho do último revelam o estado de alma de Paulo seis anos após a morte de sua querida Lúcia: "Terminei ontem este manuscrito, que lhe envio ainda úmido de minhas lágrimas. (...) Hás seis anos que ela me deixou; mas eu recebi a sua alma, que me acompanhará eternamente."

Lugar - O cenário onde se desenrola a ação é o Rio de Janeiro. Há referências de seus bairros (Santa Teresa), ruas (das Mangueiras), população, festas (a da Glória), teatros, lojas elegantes, etc.

É curiosa a relação entre os locais e o comportamento amoroso-sexual de Paulo e Lúcia, agindo aqueles no sentido de aproximação ou afastamento, de maior ou menor realização do casal. O quarto de Lúcia é um local de luxúria: "... e fazendo correr com um movimento brusco a cortina de seda, desvendou de repente uma alcova elegante e primorosamente ornada." Das várias vezes que eles se uniram sexualmente neste luxuoso aposento, nenhuma, parece, satisfez de fato o casal. A primeira delas terminou assim: "Ao delírio sucedera prostração absoluta, orgasmo da constituição violentamente abalada. Vendo então este corpo inerte e pasmo, com os olhos vítreos e as mãos crispadas, tive dó."

O segundo encontro já foi totalmente diferente, em local e desfecho. Foi nos jardins da casa do Dr. Sá, onde Lúcia desfilara nua perante os convidados. O cenário é bem ao gosto do romantismo: a natureza. O leito é bucólico: "Fomos através das árvores até um berço de relva coberto por espesso dossel de jasmineiros em flor. Lúcia está vibrando: "- Sim! Esqueça tudo, e nem se lembre que já me visse! Seja agora a primeira vez!... Os beijos que lhe guardei, ninguém os teve nunca! Esse , acredite, são puros!" E o clímax foi aquele que só um par enamorado consegue haurir do sexo: "Não fui eu que possuí essa mulher; e sim ela que me possuiu todo, e tanto, que não me resta daquela noite mais do que uma longa sensação de imenso deleite, na qual me sentia afogar num mar de volúpia."

Quando Lúcia passou a morar numa casa pequena e pobre, em Santa Teresa, em companhia de sua irmã Ana, menina inocente, não mais houve união carnal entre eles. É que os dois já estavam unidos por um amor espiritual. Uma afeição muito pura unia aquelas duas almas. E tanto a simplicidade do local que "lembra o espaço feliz de sua infância em São Domingos" quanto a inocência da menina não comportava mais a depravação do sexo. O seu beijo quase de irmã apenas de longe em longe bafejava-me a fronte."

Personagens - Em Lucíola uma personagem apresenta grande complexidade psicológica, a par do idealismo romântico com que foi concebida:

Lúcia - Sua principal característica é a contradição. Como cortesã era a mais depravada. Basta que se lembre da orgia romana em casa de Sá. No entanto, a prostituição era-lhe um tormento constante, já que não se entregava totalmente a ela. E os atos libidinosos constituíam para ela verdadeira autopunição aliada à angustiante sentimento de culpa. Coexistem nela duas pessoas: Maria da Glória, a menina inocente e simples, e Lúcia, a cortesã sedutora e caprichosa. No livro, sobressai a Lúcia, Lúcifer, onde aparece 348 vezes contra 10 vezes como Maria da Glória, anjo. Tal disparidade realça o motivo do romance: à proporção que Lúcia vai amando e sendo amada por Paulo, ela vai assumindo a Maria da Glória, sua verdadeira personalidade. E reencontra assim, através dele, a dignidade e inocência perdidas. Pode-se expressar essa duplicidade da seguinte maneira:
Lúcia, mulher, depravação, luxúria, sentimento de culpa, prostituição, caprichosa, excêntrica, rejeita o amor, demônio.

Maria da Graça, menina, pureza, ingenuidade, dignidade, inocência, simples,  meiga, tende para o amor, anjo. Perdida a virgindade física, Lúcia, por meio da compreensão e amor de Paulo, tende para a virgindade do espírito. "Elas não sabem, como tu, que eu tenho outra virgindade, a virgindade do coração!" Para isso renuncia a qualquer amor sensual. Mesmo ao de Paulo, de quem fora amante e a quem passou a negar um simples beijo. Depois que ela o conheceu, não se entregou a nenhum outro homem. É por isso que não cria no amor de Margarida, de A Dama das Camélias, porque ela não negou ao seu amado Armando o corpo que tantos já haviam comprado.

E Lúcia recupera aos 19 anos a Maria da Glória que perdera aos 14. "Nada perturbava a serenidade de Lúcia. Parecia realmente que sua alma cândida, muito tempo adormecida na crisálida, acordara por fim, e continuara a mocidade interrompida por um longo e profundo letargo. (...) Ninguém diria que essa moça vivera algum tempo numa sociedade livre."

Mas essa transformação completa custou-lhe penosos sacrifícios e sobretudo muita incompreensão inicial por parte de Paulo. "Incompreensível mulher! (...) Compreendo hoje as rápidas transições que se operavam nessa mulher; mas naquela ocasião, como podia adivinhar a causa ignota que transfigurava de repente a cortesã depravada na menina ingênua, ou na amante apaixonada!"

Seus traços físicos: cabelos e olhos pretos, a pele pálida. Sua expressão, contudo, lembra ao leitor sua dualidade de caráter: o olhar ora é "eloqüente, raio voluptuoso", ora é límpido, raio de luz de sua alma". É bem o ideal de beleza romântica, "com sua virgindade de alma tão pura e tão absoluta, que a não tisnaram os pecados do corpo. Por isso, mesmo nas horas em que mais lhe esplende a glória de cortesã, o romancista a veste simbolicamente de branco."

Se algum leitor não entender bem a complexidade da personagem Lúcia, como o fez Paulo no início do romance, não é de se estranhar, pois afinal ela mesma se auto-definiu: "É difícil conhecer-me; mais difícil do que pensa. Eu mesma, sei o que às vezes se passa em mim? Não repare nestas esquisitices!"

Paulo - É um provinciano de Pernambuco, 25 anos, que veio tentar se estabelecer no Rio de Janeiro. O romance não esclarece se ele é ou não formado. Sugere apenas. É o narrador da história e como tal faz desviar a atenção do leitor para Lúcia e outros aspectos, não revelando certas informações suas. Os detalhes físico, por exemplo. Coisa, aliás, rara em José de Alencar, tratando-se de personagem central.

Traçando o perfil de Lúcia, ele acaba por revelar também os eu: espírito observador e sensível, foi o único a compreender o estranho caráter de Lúcia. Seu temperamento é reservado sem ser tímido:  "... é hábito meu, desde que entrei no mundo, não admitir os estranhos à intimidade de minha vida, ainda mesmo quando se trata de objetos sem conseqüência. Só dispo a minha alma entre amigos". E como ele não possui reais amigos no Rio, nuances de sua personalidade conhecem-se por deduções .

Suas reações psicológicas são expressas em suas reflexões: "Que miserável animalidade havia em mim naquela noite! Quando essa pobre mulher atingia o sublime do heroísmo e da abnegação, eu descia até a estupidez e à brutalidade!" Ou nessa: "Não conheço mais estúpido animal do que seja o bípede implume e social, que chamam homem civilizado."

A sua caminhada em direção ao amor pela heroína foi lenta. No início, o que o impelia para ela era atração sexual. Paulo, então, não a entende e transmite ao leitor suas incertezas e desconfianças. "Se eu amasse essa mulher... mas tinha apenas sede de prazer; fazia dessa moça uma idéia talvez falsa... " Tais desconfianças, por vezes, eram-lhe inoculadas pela sociedade através de alguns representantes - Dr. Sá, Sr. Couto, Cunha. "Cunha tinha razão, pensei eu; a cupidez e a avareza são as molas ocultas que movem este belo autômato de carne." E chega mesmo a ser violento e sádico com ela. Isto se deduz de várias passagens, como: "Esta noite a senhora não se pertence: é um objeto, um bem do homem que a vestiu, que a enfeitou e cobriu de jóias, para mostrar ao público a sua riqueza e generosidade." Outras vezes, sentiu foi dó: "Sentia profunda compaixão por essa mulher. O seu pranto me enterneceu; chorei com ela." Houve um período em que a afeição de ambos se arrefeceu. Paulo já a admira e dedica-lhe grande respeito e amizade: "Entramos então numa nova fase de nossa mútua existência, fase original e curiosa que me faria rir quinze dias antes. Com efeito, quem poderia julgar possível uma amizade fraternal e pura entre duas criaturas que meses antes trocavam as mais ardentes expansões da sensualidade?" Para no final devotar-lhe sincero amor a ponto de vibrar com um possível filho de ambos: " -Um filho! Mas é um novo laço e mais forte que nos prende um ao outro. Serás mãe, minha querida Maria?"

É um ingênuo personagem romântico. Apesar de se declarar pobre e até se vexar por isso, vive byronicamente, de sonhos, de amor.

Os demais personagens são secundários face aos dois protagonistas.

Dr. Sá e Cunha - Amigos de Paulo, sendo aquele desde a infância. Encarnam a moral burguesa e suas máscaras: austera com os outros, benigna consigo. Não possuem personalidade bem delineada no livro. Ambos vêem em Lúcia apenas a prostituta.

Couto e Rochina - O primeiro é um velho dado a jovem galante. Encarna a obsessão sexual e a velhice. Representa a sociedade que explora e corrompe. Foi quem aproveitou a necessidade e inocência de Lúcia. O segundo é um jovem de 17 anos, tez amarrotada, profundas olheiras, velho prematuro. Libertino precoce. Eles aparecem assim no romance: "O contraste do vício que apresentavam aqueles dois indivíduos: o velho galanteador, fazendo-se criança com receio de que o supusessem caduco; e o moço devasso, esforçando-se por parecer decrépito, para que não o tratassem de menino; essa antítese vivia devia oferece ao espectador cenas grotescas."

Laura e Nina - São meretrizes, como Lúcia, mas sem sua duplicidade de caráter. Não são capazes de "descer tão baixo" porém, não possuem a "nobreza e altivez" da protagonista.

Jesuína e Jacinto - Aquela, é mulher de 50 anos, seca e já encarquilhada. Foi quem recolheu Lúcia quando seu pai a expulsou de casa e a iniciou na prostituição. Este, é um homem de 45 anos, e "vive da prostituição das mulheres pobres e da devassidão dos homens ricos". Por seu intermédio Lúcia vendia as jóias ricas que ganhava e enviava o dinheiro à família pobre. É quem mantém a ligação misteriosa no livro, entre Lúcia e Ana. Enfim, é quem cuida dos negócios dela.

Ana - É a irmã de Lúcia, que a fez educar num colégio até os doze anos como se fosse sua filha. "Era o retrato de Lúcia, com a única diferença de ter uns longos e de louro cinzento nos cabelos anelados. Ana já conhecia a irmã e a amava ignorando os laços de sangue que existiam entre ambas." Lúcia tenta casá-la com Paulo para ser uma espécie de perpetuação e concretização de seu amor por ele: "Ana te darias os castos prazeres que não posso dar-te; e recebendo-os dela, ainda os receberias de mim. Que podia eu mais desejar neste mundo?"

Problemática apresentada - Paulo quer Lúcia, mas ele possui impedimento de aproximação; Lúcia quer Paulo, mas também possui impedimentos. É fácil, agora, entender como se arma o conflito do romance:
Paulo x Lúcia - Há motivos de aproximação e de afastamento entre ambos. E do jogo aproximação-afastamento. Chegamos a uma composição final. A composição é desejada por ambos, mas é preciso que antes muitas arestas sejam aparadas. Não é graciosamente que o ser humano se completa a se acha, mas através de muita luta e muito erro (penitência para superação dos defeitos).

Esta colocação do foco narrativo do romance vem confirmar idéias anteriores, onde se mostrou que a história de Paulo e Lúcia está vazada de situações desarmônicas. Tais situações podem ser melhor entendidas quando sintetizadas em algumas oposições que parecem predominar na obra como idéias centrais. Tais como:

O desnível da situação social - Em Lucíola os conflitos das personagens e entre personagens são determinados pelo confronto do indivíduo com essa sociedade.Há um desnível enorme entre a situação social de Paulo e Lúcia. Esta é prostituta e como tal é vista e rejeitada por todos, inclusive por Paulo, no início. Trata-se de um impedimento sério na aproximação de ambos. Tão sério que acaba por impedir a concretização social (casamento, geração de filhos) do amor do casal. Lúcia errou e deve pagar por isso perante a sociedade. As convenções da moralidade burguesa e da Escola Romântica assim o exigem. O casamento com final feliz do romance romântico não se realiza. Lúcia deve morrer.

Uma das problemáticas centrais  levantadas no livro, parece, portanto, esta: a imposição das convenções sociais, criando obstáculos ao par amoroso, sacrificando-lhe a realização de um amor que não se adequava aos seus padrões rigorosos, se bem que por vezes hipocritamente condescendentes.

O conflito entre o bem e o mal - Das muitas oposições enfocadas no livro, esta é a mais importante, agindo como base do enredo e do foco narrativo. Trata-se de um tendência própria do Romantismo que se traduz na "desarmonia" de situações e sentimentos.

Há uma dualidade no caráter de Lúcia: de um lado a mulher, meretriz, depravada, desprezada pela sociedade, encarnacão do MAL; de outro, a menina inocente que ainda teima em substituir nela por mais terríveis que tenham sido os imperativos do vício naquela alma. É a permanência do BEM. "Havia no meu coração certos germes de virtude que eu não podia arrancar, e que ainda nos excessos do vício não me deixavam cometer uma ação vil." E durante todo o tempo, pretende o autor convencer o leitor da "criatura angélica" que habita o corpo da pecadora, da "mulher que no abismo da perdição conserva a pureza d'alma". E é essa Lúcia de "coração virgem", purificada, que renasce nos últimos capítulos graças ao amor de Paulo.

A vitória do amor - E chega-se, afinal, à temática básica de Lucíola. A intriga é calcada em assunto romântico: A situação social da mulher em face do amor. Do "amor" como o concebe o Romantismo: sublimado, capaz de renúncias, de sacrifícios, de heroísmos, que está acima dos fatores sócio-econômicos, que triunfa apesar das convenções sociais.

Em Lucíola, o triunfo do amor não foi na linha do final feliz. Lúcia passará por um processo de transformação, ou renascimento, que fará desabrochar a adolescente pura e ingênua que fora um dia, ao mesmo tempo que irá eliminando a cortesã impudica. E a protagonista alcança, portanto, a purificação através do amor espiritual, que não pode ser contaminado e profanado pela mais leve sombra de desejo físico. É a vitória do amor, numa outra perspectiva. É a temática central do romance: o amor como força regeneradora.

O romance, na sua intriga e temática, bem como no posicionamento das personagens, pode ser visualizado graficamente assim: na busca mútua de Lúcia e Paulo, há personagens que se posicionam como obstáculos, no sentido de impedir o surgimento do amor dos dois: Couto, Sá, Cunha, Rochinha. Outros são basicamente neutros: Jesuína, Jacinto, Laura e Nina. E há uma, Ana, que se coloca no sentido de aproximar o par romântico, a tal ponto de, conforme o desejo de Lúcia, ser um símbolo de perpetuação, na terra, do amor do casal.

Enredo

Paulo Silva, o personagem-narrador, é um rapaz de 25 anos, pernambucano, recém-chegado ao Rio de Janeiro, em 1855, com a intenção de aí se estabelecer.

No dia mesmo de sua chegada à corte (Rio de Janeiro), após o jantar, sai em companhia de um amigo para conhecer a cidade. Na rua das Mangueiras vê passar em um carro uma jovem muito bela. Um imprevisto faz parar o carro, dando a Paulo a oportunidade de repará-la melhor. Dia após, em companhia de outro amigo, o Dr. Sá, Paulo participa da festa de N. Senhora da Glória, quando lhe aparece a linda moça. Informando-se do amigo, fica sabendo tratar-se de Lúcia, a prostituta mais bela, requintada e disputada da cidade. Mas ele se impressiona com a "expressão cândida do rosto e a graciosa modéstia do gesto, ainda mesmo quando os lábios dessa mulher revelam a cortesã franca e impudente."

Mais ou menos um mês após sua chegada, Paulo vai à procura de Lúcia, levado, é claro pelo desejo de possuir aquela linda mulher. Após longa e agradável conversa, acaba se surpreendendo com o "casto e ingênuo perfume que respirava de toda a sua pessoa". A um mínimo lance de seus seios, "ela se enrubesceu como uma menina e fechou o roupão" discretamente. E ele, que fora quente de desejos, agora, na rua, se acha ridículo por não haver ousado mais. Além do que, o Dr. Sá lhe confirmara que "Lúcia é a mais alegre companheira que pode haver para uma noite, ou mesmo alguns dias de extravagância."

No dia seguinte Paulo está de volta à casa da heroína. Ao seu primeiro ataque, Lúcia se opõe com duas lágrima nos olhos. Supondo ser fingimento, mostra-se aborrecido e ela reage  atirando-se completamente nua em seus braços, já que era isso que Paulo queria. Mas no auge do prazer do sexo, Paulo percebe algo diferente nas carícias de Lúcia: mesmo no clímax do gozo, parece que ela sofria. Sente, na hora, um imenso dó, ao que ela corresponde cinicamente: "- Que importa? Contanto que tenha gozado de minha mocidade! De que serve a velhice às mulheres como eu?" Ele quer pagar-lhe, ela rejeita com um meigo aperto de mão. E ele retira-se realmente confuso com "a singularidade daquela cortesã, que ora levava a impudência até o cinismo, ora esquecia-se do seu papel no simples e modesto recato de uma senhora".

E as informações que lhe chegam a seu respeito são as piores. O Cunha diz que ela é "a mais bonita mulher do Rio e também a mais caprichosa e excêntrica. Ninguém a compreende. "Nunca fica muito tempo com o mesmo amante, "pois não admite que ninguém adquira direitos sobre ela." Além do mais, é avarenta. Vende tudo o que ganha. Até roupas. Para Paulo, no entanto, ela parece ser ao contrário de tudo isso. Afinal, ela finge para ele ou já o ama? Paulo fica em dúvida atroz.

Por aqueles dias, numa ceia em casa do Sá, com pessoas (Lúcia, Paulo, Sr. Couto, Laura, Nina, Rochinha, etc...) maldosamente convidadas para transformar a ceia em bacanal, Lúcia desfila toda nua, imitando as poses lascivas dos quadros que estavam nas paredes, ante os olhares voluptuosos dos presentes. Depois, em lágrimas, nos jardins da casa, ela se explica a Paulo. Fez aquilo por desespero, pois ele havia zombado dela momentos antes: "se o Senhor não zombasse de mim, não o teria feito por coisa alguma deste mundo..."E depois porque teria sido uma decepção total, afinal o que Sá pretendia era mostrar a seu amigo Paulo quem era Lúcia. "Não foi para isso que se deu essa ceia?! - explicou Lúcia. E os dois se amaram profundamente, lá mesmo no jardim, á luz da lua, até de madrugada.

Decorridos alguns dias, Paulo de certo modo passa a morar com Lúcia, e, apesar das prevenções e restrições, mais e mais se liga a ela por afeto. Lúcia, por sua vez, já ama Paulo e se entrega e ele como a um dono e senhor. Há momentos de atritos entre ambos. Passageiros, e todos causados pelo egoísmo e incompreensão de Paulo que não entende as profundas transformações que o seu afeto operou nela. E a tal ponto , que ela não suportaria mais a idéia de se lhe entregar na cama, pois sente por ele um amor muito puro e profundo. E ele, levado mais por desejo que por afeto, não consegue aceitar esse comportamento sublime.

As más línguas já comentam que Paulo, além de viver à custa de Lúcia, ainda a proíbe de freqüentar a sociedade. Lúcia que já então procurava viver mais retraída dispõe-se a voltar à vida mundana apenas  para salvar-lhe a reputação. Mas Paulo - complicado, sádico, estúpido e chato - não compreende.

Lúcia já não vibra como outrora. Mesmo quando excitada por Paulo. É a doença que já se faz sentir. Paulo não entende essa frieza e por vezes se exaspera. Ela sofre calada pois reconhece que "o amor para uma mulher como eu seria a mais terrível punição que Deus poderia infligir-lhe!". O grande sentimento que os unia, arrefece, dando lugar a uma amizade simplesmente.

O comportamento de Lúcia é cada vez mais sublime e heróico. Já não existe mais nada da antiga cortesã. E Paulo, por fim, entende essa nobreza de caráter e compreende o porquê das suas recusas. Ela lhe recusava o corpo porque o amava em espírito. E também porque já está doente. Paulo promete respeitá-la de ora em diante.

Lúcia um dia lhe revela todo o seu passado. Chamava-se Maria da Glória. Era uma menina feliz de 14 anos e morava com os pais, quando, em 1850, sobreveio a terrível febre amarela. Seus pais, os três irmãos, uma tia caíram de cama, Ela ficou só. No auge do desespero, resolveu pedir ajuda a um vizinho rico, Sr. Couto, que em troca de algumas moedas de ouro tirou-lhe a inocência. "o dinheiro ganho com a minha vergonha salvou a vida de meu pai e trouxe-nos um raio de esperança." Seu pai, porém, sabendo da origem do dinheiro, e supondo ter a filha um amante, a expulsou de casa. Sozinha, sem ter aonde ir, foi acolhida por uma mulher, Jesuína, que, quinze dias depois, à conduziu à prostituição, estipulando pela beleza de seu corpo um alto preço. O dinheiro, ela o usava para cuidar do que restava da família: "e eu tive o supremo alívio de comprar com a minha desgraça a vida de meus pais e de minha irmã".

Uma colega de infortúnio foi morar com ela. Chamava-se Lúcia. Tornaram-se amigas. Lúcia morreu pouco depois. No atestado de óbito, a heroína fez constar que a falecida se chamava Maria da Glória, adotando para si o nome da amiga morta. "Morri pois para o mundo e para minha família. Meus pais choravam sua filha morta; mas já não se envergonhavam de sua filha prostituída." E todo dinheiro que ganhava, destinava-o à preparação de um dote para sua irmã, Ana, a qual passou a manter num colégio interno depois da morte dos pais.

Agora Paulo compreende ainda melhor as atitudes misteriosas e contraditórias que Lúcia tomava como cortesã. É que esse gênero de vida lhe parecia sórdido e abjeto. Ela suportava como a um martírio, uma autopunição, uma maneira de reparar o seu pecado. Conhecido se passado heróico, ele passa a sentir por Lúcia uma grande ternura e um amor sincero.

Seguem-se dias tranqüilos. Lúcia muda-se para uma casinha modesta e Ana mora com ela. "isto não pode durar muito! É impossível!" É o pressentimento da morte. Lúcia tenta convencer Paulo a se casar com Ana, que já o ama também. Seria uma maneira de perpetuar o amor de ambos, já que ela se julga indigna do puro amor conjugal. Paulo rejeita com  veemência em nome do amor que não sente por Ana.

Lúcia aborta o filho que esperava de Paulo. Ela se recusa a tomar remédio para expelir o feto morto, dizendo "Sua mãe lhe servirá de túmulo". E já no leito de morte, recebe o juramento de Paulo prometendo-lhe cuidar de Ana como sua filha. E morre docemente nos braços de seu amado, indo amá-lo por toda a eternidade.